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sexta-feira, 21 de março de 2014

Nova vaga de imigrantes clandestinos

A vaga de imigrantes que tentam chegar à Europa revelou-se nos últimos dias de grandes proporções, tanto os que atravessando o norte da África tentam a fronteira de Melilla como os que atravessando o mediterrâneo tentam a ilha de Lampedusa. Nada que não seja previsível. À espera têm, muitas vezes, as autoridades que os intercetam e detêm em centros de acolhimento.
Em seguida, espera-os o regresso às terras de origem, a volta ao nada, onde o que podem fazer é voltar a tentar de novo os perigos da imigração. A Europa, a terra de todos os sonhos, é uma casa fechada, com portas onde não é possível bater, os que insistem não apenas ficam nas mãos de máfias clandestinas, muitos caindo nas valas de Ceuta e Melilla e morrendo em barcos superlotados. Pode lá haver coisa pior que túneis sem saída! A emigração está assim.


quarta-feira, 19 de março de 2014

Ainda, os ciganos e a educação

Algumas certezas todos temos: a educação é nas sociedades modernas o melhor meio para assegurar a inserção social das minorias, no seu acesso a direitos e a oportunidades iguais; a situação específica dos ciganos traz-lhes desvantagens tanto no acesso como na frequência escolar, por discriminação, insegurança, preconceito, não reconhecimento da língua, falta de assiduidade, níveis elevados de abandono, insucesso  e pouca valorização familiar da escola..
No entanto, já se fez muito caminho, já se deram passos concretos de apoio e de diferenciação positiva a estas comunidades. 
Uma das últimas coisas que fiz  profissionalmente, na DGIDC, em  2007, foi a participação no projecto "Lançar pontes, falar de nós" que teve como objectivo conhecer boas práticas, partilhar e debater experiências bem sucedidas, de modo a construir respostas integradas sobre a inclusão e o sucesso escolar dos alunos pertencentes à minoria cigana. 


terça-feira, 18 de março de 2014

As praxes e a liberdade individual

O argumento mais forte que tem sido: a pessoa, num acto de liberdade, decide ser praxada, podia ter dito que não queria e não disse; a pessoa num acto de liberdade decide praxar, integrar uma organização, submeter-se a um código, cumprir ordens de um “ditador”, andar com sapatos rotos até ao indescritível, remendados com fita adesiva preta (a cena dos sapatos que uma jovem da Lusófona mostrou na televisão, e a justificação dada para esta e outras coisas: “são parte de mim, da minha história…”, mostra, à evidência, não apenas o absurdo, mas também a perigosidade do que aqui está em causa). Que valores são estes? Em nome de quê?
Também, o reitor dessa universidade usou o argumento da liberdade: “vamos lá proibir! É lá isso possível! A liberdade é um valor intocável, no tempo do fascismo e das ditaduras é que se proibia a expressão da liberdade…”
Então, em nenhum momento, cai o argumento da liberdade individual? Não cai, quando estes jovens estão submetidos à mais pura das hierarquias? Não cai, quando se expõem fragilidades, lavam mentes, exploram sentimentos, humilham pessoas, violam direitos…?
Claro que cai, claro que se violam direitos. Aliás, a praxe é em si mesma a violação de uma liberdade. Ao colocar-se o praxado numa situação de absoluta incapacidade de fazer ou de dizer o quer que seja, a não ser o que o lhe é exigido, quebra-se a reciprocidade eu-tu, há, desde o início, uma liberdade anulada, por isso, a humilhação pode estar a uma curta distância, não apenas nas praxes violentas, mas nas coisas mais inócuas, do ponto de vista dos danos físicos.
Relacionado com isto, discute-se a dificuldade em saber onde está a fronteira entre o aceitável e o não aceitável, pois o que para uns é humilhante e susceptível de ferir a sua dignidade, para outros é uma brincadeira, e portanto ninguém está em condições de determinar o que é ou não uma prática indigna.
Isto é certo. Ninguém pode falar sobre a dignidade de ninguém, por ser um valor intrínseco à própria pessoa, mas cada um sabe onde está o limite que, uma vez ultrapassado, deixa marcas, no mais profundo de si; portanto, ninguém pode pôr em causa a sua dignidade ou deixar que outros a ponham.
Acabamos de assistir a isto: pensaram (podiam) os jovens que morreram no Meco recusar-se a ir à praia nessa noite de temporal no mar? O que os impossibilitava de tomar uma atitude? Por que perderam a autonomia, por que perderam a vontade própria? É por isso que as praxes são uma indignidade e não apenas nas situações limite, como esta; são-no sempre, porque se trata de algo que é da sua própria natureza.  


Ucrânia, mais do que uma crise

Ucrânia, mais do que uma crise

Ainda não consegui escrever nada sobre a Ucrânia e aquela praça da independência, onde muitos morreram às ordens do ditador (mais de cem pessoas), outros ficaram feridos e outros vagueiam perdidos de si mesmos, incrédulos com o que se passou e se avizinha. Praça, onde, ainda assim, há qualquer coisa de profundamente humano: a proximidade com o outro. O médico que chega para tratar quem precisa, a psicóloga que montou um lugar de consulta para ouvir quem já não aguenta o desespero, enfim, um sem número de pessoas solidárias, disponíveis, para tornar menos dura uma realidade de situações extremas.
Mas, depois, vêm falar-nos de política e, logo, parece que a tal humanidade falha num qualquer ponto, agora, o atender o outro, o dar a mão, o abrir a porta, o dividir o abrigo… parecem uma quase impossibilidade; interesses particulares se impõem, há diferentes grupos e diferentes agendas, que vão da extrema-direita, a partidos democráticos, a grupos mais desorganizados. Um caldo político que não augura saídas fáceis, ainda que as instituições continuem aparentemente a funcionar, sem quebras institucionais nem legais (há quem diga que houve quebras); há um governo de transição que fará o que puder para que a eleições, já marcadas para maio, tragam uma nova luz e uma nova esperança.
Enquanto isto, que já era muito, a Rússia, que não reconhece as novas autoridades de Kiev, avança para a Crimeia, com um desplante e uma força, que o mundo pasma. Mas desta vez, parece que todos estavam acordados, Estados Unidos, União Europeia, ONU…, e a Rússia saberá que vai pagar pela violação do direito internacional e pelos desmandos desnecessários e incompreensíveis.
Uma vez mais se prova que nunca estamos a salvo, quando pensávamos que crises desta natureza se resolveriam sentados a uma mesa, o que primeiro se exibe são os tanques militares.


A menina cigana, casada aos onze anos

Uma menina de onze anos, duma comunidade cigana da região de Aveiro, foi dada em casamento a um rapaz da mesma comunidade. O caso não é único, mas, neste, as autoridades intervieram, os pais e os sogros foram levados à justiça.
Muitas vezes, as autoridades assistem sem fazer nada. O ir à escola é uma obrigação, com onze anos, aquela criança deve estar na escola e deve ter tempo para brincar. 
Os pais têm deveres e as crianças têm direitos, independentemente da etnia, cultura, local de nascimento, situação social…
Estas famílias são cidadãos portugueses, têm direitos e apoios sociais – escola, saúde, segurança social… - têm por isso de viver com os outros, socialmente, cumprindo as leis fundamentais do país.


domingo, 26 de janeiro de 2014

As praxes académicas, uma indignidade

Espero que a comunicação social continue a destapar o véu, todos os véus. O que se passa com as praxes é inaceitável e ponto, nem precisaríamos argumentar, dada a desconsideração, o desrespeito, que vai até à humilhação - em que há uma completa anulação do eu, a vítima é colocada numa posição  em que nada pode fazer, senão sujeitar-se - e à morte como pode te acontecido no Meco com os jovens da Lusófona. Ora, isto é inumano, simplesmente.

Um não regresso a casa

Ia sem saber bem o que procurar, talvez a casa, a casa dos pais. Estaria ainda de pé, passados quase quarenta anos, estaria a acácia vermelha florida e os canteiros no pátio...? E as pessoas, reencontrará alguém conhecido?
Pensava nisto, enquanto evitava um remoinho interior, que se transformou num quase mal estar. Sabia bem que nunca se regressa ao mesmo lugar, duas vezes, nunca se regressa ao ambiente que se deixa atrás, e neste caso por muitas razões. Talvez, tudo seja estranho, talvez ninguém o reconheça e talvez não reconheça ninguém. Estrangeiro na sua terra que agora talvez já não possa chamar sua. 
Desce do carro, afasta-se da estrada principal, entra na cidade, dirige-se ao sitio onde viveu anos a fio com os pais, os irmãos, os tios e os primos, reconhece as casas, a sua casa, está habitada, quem a habitará, ainda haverá lá dentro algo que possa reconhecer?
Anda mais uns passos abaixo, na direcção das ultimas casas da rua, quando vê alguém familiar, muito familiar, que caminha na sua direcção, alguém que reconhece imediatamente, permanecem frente a frente, olham-se, abraçam-se:
- “Es o Zé”
Ouve de volta: 
-“És o João”
Emocionam-se. 
-Não chores! Éramos tão amigos...
- Não, somos amigos. A tua casa foi dada a gente de fora, a pessoas que vieram do norte. Não são daqui. Queres vê-la, talvez possas?
- Não sei se quero, vim sem um plano, à espera do que encontrasse, e encontrei-te, já valeu a pena.
Continuam a conversa, que os leva longe, muito longe, a um tempo, ainda não perdido, porque muitos o recordam, mas necessariamente distante, a um tempo de muitos matizes e lados, de muitos enganos e tropeções. 
Não teve coragem de bater à sua porta, de falar com o novo dono, de dizer-lhe sem mágoa: esta casa faz parte de mim, faz parte da minha família...
Regressa a Maputo,  aliviado por não ter desfeito o encanto que a sua memória guarda de um tempo feliz e também  por ter sentido o valor da amizade.