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sexta-feira, 12 de fevereiro de 2021

Lá longe ...num lugar e tempo (9)

Saída da cidade  de Nova Lisboa, hoje Huambo 

Mas é certo que não se fazem revoluções, para que nada mude. Intuem uma tragédia, sobretudo a mãe que repetia, sem parar: -“Temos de sair, temos de sair”!

O pai debatia-se, entre o sair de imediato, deixando tudo atrás, sem organizar o mínimo que fosse ou ficar na cidade, até à próxima saída, também, em coluna militar, empacotando uma vida, em malas e caixotes que chegariam ou não a algum sítio. A aflição da mãe era tal, que decidem partir.

O que fica atrás, é nada, quando se teme pela própria vida. Levam alguma roupa, coisas pessoais, fotografias, livros.... Ficam a casa, os móveis, o jardim, o cão…; os olhos do cão, a corrida desenfreada, os uivos de aflição …, fizeram com que aquela saída fosse ainda mais dolorosa, longe de pensarem no que iriam viver, muito proximamente.

domingo, 26 de janeiro de 2014

Um não regresso a casa

Ia sem saber bem o que procurar, talvez a casa, a casa dos pais. Estaria ainda de pé, passados quase quarenta anos, estaria a acácia vermelha florida e os canteiros no pátio...? E as pessoas, reencontrará alguém conhecido?
Pensava nisto, enquanto evitava um remoinho interior, que se transformou num quase mal estar. Sabia bem que nunca se regressa ao mesmo lugar, duas vezes, nunca se regressa ao ambiente que se deixa atrás, e neste caso por muitas razões. Talvez, tudo seja estranho, talvez ninguém o reconheça e talvez não reconheça ninguém. Estrangeiro na sua terra que agora talvez já não possa chamar sua. 
Desce do carro, afasta-se da estrada principal, entra na cidade, dirige-se ao sitio onde viveu anos a fio com os pais, os irmãos, os tios e os primos, reconhece as casas, a sua casa, está habitada, quem a habitará, ainda haverá lá dentro algo que possa reconhecer?
Anda mais uns passos abaixo, na direcção das ultimas casas da rua, quando vê alguém familiar, muito familiar, que caminha na sua direcção, alguém que reconhece imediatamente, permanecem frente a frente, olham-se, abraçam-se:
- “Es o Zé”
Ouve de volta: 
-“És o João”
Emocionam-se. 
-Não chores! Éramos tão amigos...
- Não, somos amigos. A tua casa foi dada a gente de fora, a pessoas que vieram do norte. Não são daqui. Queres vê-la, talvez possas?
- Não sei se quero, vim sem um plano, à espera do que encontrasse, e encontrei-te, já valeu a pena.
Continuam a conversa, que os leva longe, muito longe, a um tempo, ainda não perdido, porque muitos o recordam, mas necessariamente distante, a um tempo de muitos matizes e lados, de muitos enganos e tropeções. 
Não teve coragem de bater à sua porta, de falar com o novo dono, de dizer-lhe sem mágoa: esta casa faz parte de mim, faz parte da minha família...
Regressa a Maputo,  aliviado por não ter desfeito o encanto que a sua memória guarda de um tempo feliz e também  por ter sentido o valor da amizade.