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segunda-feira, 31 de maio de 2010

Há ironias ...

Vi, há poucos dias, “A Gaiola das Loucas”, sem dúvida, um grande espectáculo de música, dança…, mas aqui quero falar da história, muito bem contada por sinal. O desfecho mostra bem a diferença entre a verdade e a fachada, entre o que é e o que parece ser.
O dono do cabaré vive com Zazá, a grande vedeta do transformismo, que sempre criou o seu filho com o maior desvelo. O rapaz está noivo de uma rapariga do norte, de uma família tradicional, cheia de valores e bons costumes, o pai com aspirações políticas, etc. Para não decepcionar, no jantar de apresentação, pede ao pai para alterarem tudo o que possa denunciar a verdadeira situação familiar. Mudam a decoração da casa, procuram a mãe verdadeira (que nunca viveu com ele) e insistem para Zazá não aparecer. Esta não aceita ser posta de lado, e decidem, então, fazê-la passar por um tio. Ensaiam todos os pormenores que possam denunciar as maneiras gay: o andar, o falar, o cumprimentar, o vestir…
Zazá esforça-se, mas não aguenta ver-se dentro daquele fato preto. Sobe as escadas e, quando desce,vestida como sempre, comporta-se como a verdadeira mãe do rapaz. A cena decorre, com inevitáveis equívocos, e eis senão quando o jardim e a casa são invadidos por jornalistas que querem saber o que se passa com o pai da noiva, visto que o seu sócio apareceu morto … O homem assustado (sabe-se lá por quê) tenta fugir, esconder-se, e é a própria Zazá quem o ajuda a sair pelas traseiras do cabaret. Não deixa de ser irónico: afinal, qual das famílias tinha mais a esconder? Será sequer comparável uma opção de vida, por mais estranha que pareça aos outros, a negócios pouco claros ou escuros mesmo?

sexta-feira, 28 de maio de 2010

Ainda sobre o véu islâmico


Embora, a dignidade tenha a ver com o modo como cada um se vê e se estima a si mesmo e também com o modo como deseja ser visto e estimado pelos outros


. Quando dizemos: “Sou isto e não aquilo que os outros querem que eu seja, determino o meu viver pelos meus valores, as minhas crenças e os meus sentimentos – a minha liberdade, o respeito por mim e pelos outros, a minha religião, a minha cultura…, descobrimos que a dignidade é o nosso valor intrínseco, é o que faz de nós a pessoa que somos.
A dignidade não tem preço, porque não tem equivalente. E por isso não podemos, nós próprios, pô-la em causa ou deixar que outros a ponham. Não podemos suspenda-la, feri-la, maltratá-la, negociá-la, trocá-la…, nem deixar que outros o façam. É tão importante que viver como ser humano é viver de forma digna. Se perderes a estima por ti e pelos teus valores, se perdes o respeito pelo outro, se não vires nele um semelhante, não és um ser digno de ti.

quinta-feira, 27 de maio de 2010

O véu islâmico integral

Em França, foi proibido o uso do véu islâmico integral. Eu estou de acordo, absolutamente de acordo. Sei bem que há aqui um conflito de valores, sei bem que há aqui liberdades individuais, sei bem que há muita discussão...
Mas se tivéssemos alguma dúvida de que lado estar, bastaria ver aquele grupo de mulheres, todas cobertas, apenas com os olhos a reluzir, dando uma conferência de imprensa, logo a seguir à aprovação da lei: veio-me à mente a imagem de outras conferências de imprensa em que indivíduos encapuçados se reunem atrás de uma mesa para falar aos jornalistas. Faltavam as armas e as intenções (perdoem-me, sei que isto é violento e injusto, porque estas mulheres são pacíficas, integradas, mães de família, não duvido disso), mas a imagem é igualmente tétrica. Nenhum ser humano pode estar sujeito a isto, seja qual for a crença, esta é uma questão básica de dignidade humana que se sobrepõe a tudo o mais, do ponto de vista dos valores e dos direitos humanos. O direito a um rosto, a uma identidade, a um ser para os outros. É a base do humano.

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Difícil despedida

Dois sujeitos, encostados a um muro alto, abraçados, choram, comovidamente. É noite. Parece que tinha acontecido uma despedida pouco tempo antes. Por que choram? Que sentimentos ou ilusões cairam por terra? Que expectativas e promessas ficarão por cumprir? Talvez esteja tudo cumprido, e se trate apenas de dois seres humanos unidos por um fortíssimo laço de amizade ou seja que sentimento for. Não sei, mas o momento a que assistimos é verdadeiro, não há máscaras, não há teatro. Ainda que a cena que corre mundo seja teatral e intensa.
Quando se separam, um continua imóvel e o outro, com aspecto transtornado, desce a rua e entra num carro. Dizem que se chama Mourinho, treinador de futebol, implacável, frio, calculista, racional ..... Mas, então, não é ele, ou será? Somos tanta coisa ao mesmo tempo, por que não pode Mourinho desmoronar, chorar, ser sensível, imprevisível ... Pode, claro.

terça-feira, 18 de maio de 2010

Os olhos das mães...

Toda a tristeza do mundo está nos olhos da mãe de Leandro (o menino que se atirou ao rio Tua e morreu). Fixos, perdidos, ausentes, estão sem poder reagir. Em choque, que é duro perder um filho. Demasiado duro.
Nunca mais se ouviu falar do caso, ainda decorrerão inquéritos, talvez um processo em tribunal, que sei eu! O que pode ela contra inquéritos e mais inquéritos, corporativismos, omissões e silêncios. O seu filho morreu, desnecessariamente (nenhuma morte é necessária, obviamente, mas muitas são inevitáveis). Esta não era. Está triste, dorida, cansada, ninguém sabe quanto. Ninguém nunca saberá quanto, a não ser que tenha vivido tamanho drama.

terça-feira, 11 de maio de 2010

A fé, acreditar

Ouvi um padre falar das dúvidas que tem, do questionamento diário sobre o ser crente, católico, religioso… “Hoje sou padre amanhã não sei”- disse. Penso: afinal, onde está a profundidade, a clareza, a certeza, o ponto de abrigo, a pedra angular, o mar de águas mansas …, que as religiões devem ser?
O precário, o imprevisível, a dúvida, não deviam atormentar quem estudou anos a fio teologia, alguém que sabe, até ao limite do compreensível, falar de Deus e da igreja a que pertence. (Ou não sabe?)
A igreja profética que anuncia, sustenta, acolhe, protege, tem de ter alguma radicalidade, alguns fundamentos, que a história não distorça ao sabor das marés. Nunca deveria ser uma decepção, um corte, pelo menos para quem acerca dela percebeu o essencial.
Eu percebo melhor a radicalidade e a exigência da igreja do que o “folclore” de muitas manifestações religiosas, por mais importância pessoal e cultural que tenham, talvez por isso este Papa me desperte interesse. Dizem que é um grande teólogo, um sábio…, como não vou sentir curiosidade por um sábio? Hoje, irei ao Terreiro do Paço, assistirei à missa, ouvirei o Papa, e quem sabe o resto, “não se chega a Deus por uma ideia, mas por um acontecimento”- acho que foi este Papa que disse.

sexta-feira, 7 de maio de 2010

E se um dia o mal se extinguisse...

Há 65 anos, a Alemanha nazi rendia-se. Atrás, ficavam milhões e milhões de mortos, uma Europa em ruínas e uma população marcada para sempre. Quando se chega àquele ponto, àquele grau de destruição, nada mais há a fazer: ou o fim total ou o recomeço, apesar dos destroços, das sombras, das incertezas e de tudo o mais.
A Europa reergueu-se, porventura, as cidades e os países mais depressa do que os corações e as mentes das pessoas que sobreviveram a massacres, a guerras, a racionamento alimentar, a mortes, a descrenças várias (até no ser humano!)
Passado todo este tempo, para muitos, cada vez mais, a II Guerra Mundial é um acontecimento longínquo, definitivamente arrumado numa prateleira da história. Mas não é , disso podemos ter a certeza. A maldade que levou ao nazismo não se extinguiu, não se extingue, por avanços tecnológicos e civilizacionais, apenas se controla pela educação, pela formação, pela sensibilidade e pelo respeito incondicional pelo outro, seja ele quem for. Estamos tão longe disso!

segunda-feira, 3 de maio de 2010

O direito ao trabalho, uma miragem

Passaram os séculos, as revoluções, fizeram-se e desfizeram-se impérios e tudo o mais, e quando se julgava que os direitos estavam definitivamente assegurados, eis que sobe o desemprego, a instabilidade, a descrença em melhores dias. Damos por nós à beira do precipício, onde a Grécia já caiu (ou quase) e nós estamos a um passo, dizem muitos dos que entendem.
Malditos mercados, finanças, bolsas, etc. etc., estamos presos numa teia de onde nem os gurus da economia sabem como sair. Onde foi parar o dinheiro? Quem são os especuladores? O que nos levou a este ponto? Pela primeira vez, parece mesmo não existir saída e, de crise em crise, até à derrocada final, em que teimamos não acreditar.
É preciso inventar saídas, não há respostas conhecidas ou se há não funcionam.