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sábado, 30 de abril de 2011

Liberdades e direitos

Assistimos muitas vezes a discussões absolutamente estéreis. Discutia-se a importância e a prioridade das liberdades civis e políticas face à justiça e aos direitos sociais, citando Rawls, etc., etc.
A realidade mostra que esta discussão não faz o menor sentido, pois, não chega ter liberdade para poder pensar, comunicar, reunir, votar.... e não ter trabalho, passar fome, não ter dinheiro para comer, ir à escola, etc.? É tão evidente que as liberdades e os direitos económicos e sociais têm um carácter sistémico, que o que há a discutir é a sua interdependência e a sua complementaridade.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Síria, continua o disfarce

Continua o disfarce e a prepotência também. Entretanto, um ministro, ou alguém similar, vem dizer que não precisam de um inquérito internacional ao que aconteceu nas ruas, que eles mesmos vão fazer um inquérito rigoroso para saber quem mandou os tanques para as ruas, atacar com fogo real e matar centenas de manifestantes. Hipocrisia, propaganda, uma forma de ganhar tempo. Quem é que acredita nesse inquérito?

quarta-feira, 27 de abril de 2011

Tagore

Rabindranath Tagore (1861-1941), poeta indiano, prémio Nobel da literatura em 1913, escreve sobre a cultura e a paz universais,  a partir do concreto, apelando ao infinito que povoa a mais simples das coisas ou das situações.  Deixo um dos seus aforismos:
"Se de noite chorares pelo sol, não verás as estrelas" ( in " Coração da Primavera, p.130).

... se cada um pudesse dar valor e desfrutar do que tem, rentabilizando ao máximo  aquilo de que pode dispor,  talvez  entendesse que há sempre alternativas.

terça-feira, 26 de abril de 2011

Chernobyl

Vinte  e cinco anos depois da catástrofe nuclear, a explosão do tristemente célebre reactor 4, um manto de  destruição,  penumbra e medo, como se de um temível fantasma se tratasse, invade o campo, a vida e  as almas de gerações sucessivas: como será o futuro? Incerto, com toda a certeza, quando continuam a sofrer-se os efeitos da radioctividade, ironicamente atacando os mais jovens com doenças mortais, como o cancro da tiróide.

quarta-feira, 20 de abril de 2011

Descaramento

"Estou aqui a dar o meu melhor", ouvimos um tal senhor dizer. O pior é que o seu melhor, afinal, foi (é) muito pouco. Deixaram chegar o país a isto e querem-nos fazer crer que nada têm a ver com o assunto, que se podem propor de novo a eleições e ser eleitos para representar o povo. Claro que podem, como não, o voto é livre, mas estou em crer que as pessoas não dormem.

terça-feira, 19 de abril de 2011

Massacre numa escola do Rio de Janeiro

Já por diversas vezes escrevi sobre esta violência extrema, inesperada, trágica, que ensombra as sociedades contemporâneas. Um jovem entra na sua antiga escola e de arma na mão mata doze crianças. Um massacre planeado ao pormenor, durante nove meses, deixando escritas justificações e  motivos, num emaranhado de loucura, desequilíbrio e ressentimento, como se o seu acto pudesse  servir para algo.  Desgraça, apenas, multiplicada por muitas famílias, a sua inclusive (embora pareça  que o seu corpo não foi reclamado por ninguém).

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Ajuda externa, FMI, e tudo o resto

Parece já claro que os portugueses vão perder direitos adquiridos, constitucionalmente assegurados, tudo em nome de um "reajuste" orçamental, como se oitenta mil milhões (ou mais) fosse coisa pouca, quase nada! Porquê chamar falência, resgate financeiro..., mais vale continuar como sempre, minimizando a situação. O cidadão comum que não tem nada a ver com isto pergunta com que direito diminuem o seu salário, a sua pensão, o seu  subsídio de desemprego... Com nenhum direito, com nenhuma legitimidade, mesmo que não haja outra solução. Espero que os políticos que nos conduziram a isto tenham a decência de,  pelo menos,  dizer a verdade sobre o país, as contas, o emprego... Mas não vão fazê-lo,  tenho a certeza.

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Desenvolvimento

(Um comentário ...)

É sábia a história da galinha. Mostra bem o que acontece quando as escolhas são erradas. Um dos aspectos mais importantes do desenvolvimento é o planeamento a curto, médio e longo prazo - definir objectivos, diversificar as actividades e proteger os mercados, não se pode produzir para a seguir não se conseguir vender.
Um desenvolvimento sem graves impactos ambientais, que produza tendo em conta os recursos e as condições naturais e também as necessidades das populações, por exemplo, se a base da alimentação é o milho, porque é que se vai apenas plantar café . Um desenvolvimento progressivo, sem saltos, não serve de nada montar a fábrica mais moderna do mundo, equipá-la com alta tecnologia e depois não haver técnicos especializados para operarem as máquinas ou reparar a mínima avaria. Tudo tem de estar em equilíbrio – conhecimentos, ciência, técnica e formação das pessoas.

sábado, 9 de abril de 2011

Uma história sobre o desenvolvimento

(A propósito do questionável modelo de desenvolvimento, a  história da galinha vermelha, que recolhi dum livro da UNiCEF e reescrevi)

A galinha vermelha vivia numa quinta, onde comia o que encontrava. Um dia, encontrou um grão de trigo e pensou que o melhor era semeá-lo para poder ter muitos grãos para comer. Resolveu, então, pedir ajuda a outros animais:
- Quem me ajuda a plantar este grão de trigo? – perguntou ela.
- Eu não – disse o pato – mas vendo-te alguns grãos de café, para tu plantares em vez do trigo e, assim, poderes ganhar muito dinheiro.
- Eu não – disse o porco – mas compro-te o café, quando tu o colheres.
- Eu não – disse o rato – mas empresto-te o dinheiro para comprares as sementes de café.
Convencida pelos outros animais, a galinha vermelha resolveu plantar café em vez de trigo.
- Quem me ajuda a plantar o café? – pergunta ela.
- Eu não - disse o pato - mas vendo-te o adubo para ele crescer forte e produzir bem.
- Eu não - disse o porco - mas vendo-te os insecticidas, para ele não ter doenças e crescer forte e bem.
- Eu não - disse o rato – mas empresto-te o dinheiro, para comprares o adubo e os insecticidas.
A galinha trabalhou muito. Sem ajudas, plantou, adubou e pulverizou. Tinha gasto muito dinheiro, mas estava feliz porque pensava que iria ganhar uma fortuna com a venda do café que iria colher.
- Quem me ajuda a vender o café? – pergunta ela.
- Eu não - disse o pato - mas tu tens necessidade da minha fábrica para o torrares e para o embalares.
- Eu não – disse o porco – toda a gente está a produzir café e os preços estão muito baixos.
- Eu não - disse o rato - mas neste momento, tens que pagar o que me deves.
Só nesta altura, a galinha vermelha viu que tinha cometido um grave erro ao decidir plantar café em vez do trigo. Tinha ficado cheia de dívidas e sem nada para comer.
- Quem me dá qualquer coisa para comer? – perguntou ela.
- Eu não - disse o pato - porque não tens dinheiro para pagar.
- Eu não - disse o porco – porque todos plantaram café e já não há muita coisa para comer.
- Eu não – disse o rato – mas vou ficar com a tua terra em lugar do dinheiro que me deves e não me consegues pagar. Fico com a tua terra, mas podes viver nela se trabalhares para mim.

sexta-feira, 8 de abril de 2011

O povo cigano

Hoje, é o dia internacional dos ciganos. A Amnistia Internacional inaugura uma exposição e organiza uma tertúlia para  dar visibilidade a uma minoria que tem há muitos séculos permanecido numa espécie de  margem. Os ciganos portugueses, entre quarenta a cinquenta mil, não se sabe ao certo quantos são, vivem espalhados por todo o pais. Mas talvez seja o Alentejo a região  com maior número de comunidades ciganas, muitas delas em grande desintegração social.

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Centenas de mortos, em Abidjan

Parece, finalmente, à beira do fim a crise na Costa do Marfim, mas a que custo, pensamos todos! Desde Novembro que o presidente eleito pelo povo, em eleições reconhecidas pela comunidade internacional, não pode governar. O ex presidente perdeu, mas não aceita o facto, fez tudo (e continua a fazer, tem essa ilusão) para se manter no poder. Mesmo agora, quando todos os seus lacaios já o abandonaram, resiste no bunker da sua residência. Que cegueira é o poder! Como irá acabar tudo isto?  Ainda não sabemos.

terça-feira, 5 de abril de 2011

Reinserção (ou talvez não)

- Para a “bófia” todos aqui são drogados e ladrões.
- E não são, pois não?
- Claro que não. Há “bué” de gente que trabalha e putos que andam na escola.
- E tu andas?
- Não. Já andei, mas não gostava, não sabia nada, era perder tempo. Quando os “cotas” foram dentro nunca mais voltei à escola.
- Os teus pais estão presos?
- Estão, há “bué” de tempo....
Faz silêncio e olha-me intensamente, não sei se com raiva se com súplica, como se eu tivesse alguma coisa a ver com tudo o que lhe estava a acontecer e pudesse ajudá-lo.
- O que é que tem, estarem presos? – Pergunta-me, zangado.
- Eu não disse nada. Esperavas que eu tivesse feito algum comentário?
- Andavam a vender (droga), andavam, e depois? O que é que tem? Também já vendi, agora não vendo, não vou vender mais.
- Costumas ir à Associação?
- Não vou, é tudo mentira. Mentem-me, mentiram-me sempre.
- Não acreditas neles?
- Prometeram comida, trabalho e “cenas” dessas e nada,  muitas vezes passo fome, tenho que roubar, percebe, tenho de roubar, roubar percebe, veja se percebe....
- E tu o que é que lhes prometeste?
- Nada, não prometo nada, não me chateiem, falam de tretas e vem a “bóbia” e vamos presos.
- Achas que vais preso?
- Se vou preso? Todos os meus amigos estão presos, até aos dezasseis anos um gajo anda na boa, depois toma, caem em cima e toca a andar. Qualquer dia vou.
- Podes não ir, isso só depende de ti.
- Não me importo, não me importo mesmo...
- Eu importo-me que tu vás preso e há outras pessoas que também se importam, tenho a certeza.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Somos todos responsáveis

Pergunto ao jovem que me ajudou a arrumar o carro e com quem converso, enquanto procuro uma moeda: - Por que não me olha? Fala sem me olhar.
- Nunca olho ninguém, senhora. Ninguém me olha e eu também não olho ninguém. É assim, e não me importo nada. Estamos quites.
Lembro-me de Lévinas (filósofo, 1906-95) e contraponho: - Eu gosto de olhar as pessoas, penso que os rostos falam. Não acha que tenho razão?
Fico sem resposta, porque, entretanto, chegou outro carro para arrumar. E chegará outro e outro, e quantos mais melhor, até à quantia exacta de mais uma dose, num ciclo infernal (julgo eu) em que aquela vida se transformou.
Aqui, como em muitos outros casos, chegámos ao limite, à fronteira, da não relação. O “o olhar no rosto”, a proximidade com aquele que me olha e a quem eu olho, há muito que deixou de existir. O passo, até à quase desumanidade, está a uma curta distância.

Eu sei que tens razão (desculpa, começar-te a tratar por tu, é uma forma de te sentir próximo), muitos não te olham, não querem mesmo olhar-te. Desejariam que não existisses ou que não te cruzasses no caminho. Se calhar, a maioria, até. Eu mesma, para quê ser hipócrita, desejaria que não estivesses aqui, mas estás e isso não me é indiferente. Por quê, então, negares o olhar a quem deseja fixá-lo, a quem quer ver para além do que aparentas ser?
Dirás que não tenho nada a ver com isso. Às vezes também penso assim. Apetece-me ir na onda e acreditar que ninguém falhou, só tu falhaste, que não tenho nada a ver com o que te está a acontecer. É um problema teu, da tua família, mas meu não.
Outras vezes, reivindico direitos para ti, respostas sociais, que deviam existir (e funcionar) para que não tivesses chegado onde chegaste. Revolto-me. Para que pago eu impostos, para viver numa sociedade que não cuida de quem precisa, num país que deixa cair nas margens cada vez mais pessoas?
Vêm-me à cabeça as perguntas que tantas vezes faço: – Quantos direitos ficaram por cumprir? Quantos te foram negados? Quantos tu dispensaste, porque não quiseste assumir deveres? Que instituições falharam (e continuam a falhar)? Falhou a família, os amigos, as associações, a polícia, o patrão? Terá havido de tudo, quem te tenha aberto a porta vezes sem conta e também quem a tenha fechado muitas vezes.

sábado, 2 de abril de 2011

Público e privado

Li grande parte do livro de Ingrid Betancourt "Até o silêncio tem um fim", sobre os mais de seis anos na selva colombiana. Há partes e descrições impressionantes,  mas por vezes ficamos a pensar até que pronto é legítimo  ela falar, com  o pormenor e a subjectividade (inevitável) com que o faz, dos companheiros de cativeiro, por exemplo, de Clara Rojas (também li o seu livro e não fiquei com a mesma sensação). Julgo que, por mais que seja importante ter relatos destes, há aspectos sobre os quais, envolvendo tão directamente outras pessoas, o silêncio devia continuar e não serem tornados públicos por terceiros,  Há uma linha que não se pode ultrapassar, percebo a polémica sobre o livro, na Colômbia.