Ia sem saber bem o que procurar,
talvez a casa, a casa dos pais. Estaria ainda de pé, passados quase quarenta anos,
estaria a acácia vermelha florida e os canteiros no pátio...? E as pessoas, reencontrará alguém conhecido?
Pensava nisto, enquanto evitava um
remoinho interior, que se transformou num quase mal estar. Sabia bem que nunca se
regressa ao mesmo lugar, duas vezes, nunca se regressa ao ambiente que se deixa atrás, e neste caso por muitas razões. Talvez, tudo seja estranho, talvez
ninguém o reconheça e talvez não reconheça ninguém. Estrangeiro na sua terra
que agora talvez já não possa chamar sua.
Desce do carro, afasta-se da estrada
principal, entra na cidade, dirige-se ao sitio onde viveu anos a fio com os pais, os irmãos, os tios e os primos, reconhece as casas, a sua casa,
está habitada, quem a habitará, ainda haverá lá dentro algo que possa
reconhecer?
Anda mais uns passos abaixo, na
direcção das ultimas casas da rua, quando vê alguém familiar, muito familiar, que
caminha na sua direcção, alguém que reconhece imediatamente, permanecem frente
a frente, olham-se, abraçam-se:
- “Es o Zé”
Ouve de volta:
-“És o João”
Emocionam-se.
-Não chores! Éramos tão amigos...
- Não, somos amigos. A tua casa foi dada a gente de fora,
a pessoas que vieram do norte. Não são daqui. Queres vê-la, talvez possas?
- Não sei se quero, vim sem um plano, à espera do que encontrasse, e encontrei-te, já valeu a pena.
Continuam a conversa, que os leva
longe, muito longe, a um tempo, ainda não perdido, porque muitos o recordam,
mas necessariamente distante, a um tempo de muitos matizes e lados, de muitos
enganos e tropeções.
Não teve coragem de bater à sua porta, de
falar com o novo dono, de dizer-lhe sem mágoa: esta casa faz parte de mim, faz
parte da minha família...
Regressa a Maputo, aliviado por não
ter desfeito o encanto que a sua memória guarda de um tempo feliz e também por ter sentido o valor da amizade.