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terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Revolução de Jasmim, um amanhecer desfeito


Passam dois anos sobre a Revolução de Jasmim ou a Primavera árabe, começada na Tunísia e que se estendeu, depois, a outros países árabes, até aí, blindados à democracia e à livre expressão do seu povo. Foi assim na Líbia, no Egipto, no Iémen…, mas o que parecia uma aurora de liberdade e de bem-estar transformou-se, pouco a pouco, numa desilusão para muitos dos próprios e para o mundo em geral que acreditaram que outro devir fosse possível.
Por quê? Por que é que depois de eleições, aparentemente livres e justas, ganham maiorias islâmicas? Por que é que o Presidente Morsi, da Irmandade Muçulmana, acaba de convocar um referendo para chamar a si poderes para lá do que lhe permite a constituição do país? Por que é que o governo de Damasco continua, depois de tantas e tantas mortes? Por quê? Por quê? Podíamos continuar a questionar esta realidade, mas de pouco serviria, pois não a entendemos.
Há uma tal complexidade, ligada sobretudo ao fundamentalismo religioso (por mais que se apelidem de moderados), em que estado e religião se confundem, que torna impossível qualquer compreensão racional. Não temos categorias, faltam enquadramentos, teorizações (talvez, sejam impossíveis)...
É certo que é um outro estar. E ainda há quem entenda que não há conflito de civilizações. Há, certamente.



segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Dia Mundial dos Direitos Humanos


10  de Dezembro, passa mais um aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948). Muito caminho feito e muito ainda  por fazer, é o que podemos dizer. Às vezes, descremos, sobretudo,    quando, em tantas ocasiões, assistimos à inoperância das instituições, às burocracias, aos trâmites legais, às dificuldades, quer se trate de aprovar resoluções nas Nações Unidas, quer se trate de fazer chegar ajuda humanitária de emergência a quem precisa. Nessa altura, é impossível não pensarmos se não haverá outro entendimento para os direitos humanos, menos normativo, mais próximo e desinteressado.
Algo escapa, ao sistema jurídico e institucional que conforma os direitos humanos que impede que vivamos, todos, mais como irmãos do que como concidadãos; algo, da ordem da proximidade ética com o outro que a formalidade das leis não fixa. É sobre este algo que a reflexão tem de incidir, sob pena de  deixarmos  que cada vez seja mais difícil responder a tempo e adequadamente. 

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Paz: ano zero, sempre


Vejo as imagens do Egito, de Israel, da Síria, do Mali...e de tantos e tantos lugares, e o que me apetece é descrer em tudo. Parece que estamos sempre no início, mesmo depois de séculos e séculos de civilização. 
A Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), que assenta a sua justificação no primado da razão e da liberdade humana, diz logo no 1º artigo que “Todos os homens nascem livres e iguais, dotados de razão e consciência devem viver uns com os outros em espírito de fraternidade”. 
No entanto, estamos a anos luz deste princípio, apesar das declarações e convenções já existentes. Tudo são interesses, destes, daqueles e dos outros; enquanto o interesse comum da humanidade é todos os dias posto em causa.

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

A Faixa de Gaza


Perguntava-me um jovem: “Que conflito é este”?
É um conflito tão complexo que não se pode explicar em poucas palavras ou tomando o partido de uma das partes: israelitas ou palestinianos. Não é possível dizer que uns são bons e que os outros são maus, que uns têm razão os que os outros não. A realidade nunca é a preto e branco, são muitos os matizes. 
Na essência, o conflito é político: há a formação do Estado de Israel, depois da II Guerra Mundial, quando o sionismo (o regresso dos judeus à Terra Santa) ganha proporções. Encurralam-se os árabes, os palestinos, que sempre tinham vivido nessas terras, na Faixa de Gaza e na Cisjordânia. Estes territórios embora, hoje, sejam autónomos e com autoridade própria, não constituem ainda um estado (é isso que os palestinos reivindicam, a criação do Estado da Palestina). O conflito dura há décadas, já se sucederam várias guerras e a tensão está sempre iminente, como se viu nesta última semana.
Mas, o conflito é também religioso, e num enfoque fundamentalista, com a religião a justificar tudo o resto. Difícil de compreender, judeus e árabes condenados a viver juntos, mas separados, mesmo quando quase se tocam, como acontece nas ruas estreitas da cidade santa, em Jerusalém ou em outras cidades. As divisões são palpáveis, sabe-se bem quando estamos no bairro judeu ou quando estamos no bairro árabe; são costumes, vidas e entendimentos distintos.
A questão cultural é, portanto, outro ponto de divisão, a que se junta a questão económica e social. Tudo parece dividi-los, por mais negociações e caminhos para a paz que se retomem ou iniciem (vem de muito longe e com muitos protagonistas de ambos ao lados, os Estados Unidos do lado de Israel e países árabes do lado de Palestina). Desta vez, parece ganhar relevo o papel mediador do presidente Morsi, do Egito, desanuviando o ambiente com a retirada do Irão da linha da frente. Parece já um bom sinal para que se sentem à mesa, não os próprios, como devia ser, mas os negociadores, de modo a procurarem uma solução que, a meu ver, só será definitiva com o estabelecimento do Estado da Palestina (mesmo que a sua viabilidade económica e social seja muito precária ou quase impossível). 

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Malala, um símbolo


É uma adolescente paquistanesa que, desde há algum tempo, tem enfrentado os talibãs, por fecharem escolas  e impedirem as meninas de as frequentarem. Foi baleada por um terrorista, a mando de quem a quer silenciar. Maldade ideológica, politica, religiosa, social…
Lutou contra morte num hospital do seu país e foi hoje transferida para um hospital do Reino Unido, já fora de perigo, para que a sua recuperação se faça o melhor possível.
É um símbolo para o mundo e sobretudo uma voz para os direitos das mulheres. Não irem à escola, não aprenderem a ler, significa, naquela sociedade patriarcal, ficarem dependentes e submetidas aos maridos para tudo. Não poder ler uma receita médica, o rótulo de um medicamento, os preços no mercado, os números do autocarro... significa, uma anulação e uma limitação nos direitos individuais inconcebível.

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

A Grécia está sangrando

Diz o primeiro ministro grego à chanceler alemã: o povo não pode mais. É o sangue dos que desistem, dos  que reviram caixotes do lixo, dos que pedem esmola, dos que enfrentam a polícia, dos que vão presos, dos que palmilham estradas, dos que continuam mesmo não acreditando... É o sangue de quase todos e para quê? A descrença parece total. A imagem da senhora Merkel chega a ser patética.

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Os meninos de São Judas, o filme


O filme fala dos meninos do reformatório de São Judas, na Irlanda, em 1939. Revela uma realidade que, apesar da brutalidade de algumas práticas, como o abuso sexual e a tortura física, se prolongou, por muitas décadas, em instituições similares – e é por isso que aquela violência parece quase não nos surpreender.
Mas há sempre um limite. Tínhamos assistido à tortura dos dois jovens, debruçados sobre um banco comprido de madeira, rente ao chão, com o resto dos companheiros a assistirem – tal como se torturavam, há séculos atrás, os escravos, presos ao tronco, em espectáculo público, para que todos vissem o que lhes podia também acontecer se ousassem desobedecer – mas não estávamos preparados para a cena do assassínio de Liam, a quem o padre John mata à chicotada e  pontapé.
O padre mata por motivos impossíveis de compreender. Quer saber por que apareceu no reformatório um professor laico, William Franklin. "Será comunista"?
O professor trata os jovens como pessoas, pelo nome próprio, promete responder às suas perguntas e levá-los a pensar para lá de si próprios e dos muros do colégio. Na noite de Natal, oferece a todos uma prenda, um livro, que contém algo de especial para cada um – poesia, literatura, teatro, vida, sentimentos, comprometimento… Os miúdos decoram frases, versos, fazem coros, récitas, teatros…
Algo de novo aconteceu e o padre John não aguenta. Estes são fantasmas que se prolongam por décadas. De algum modo, todos somos testemunhas, eu própria recordo uma adolescência e um início da idade adulta em que o comunismo era uma palavra maldita, como não seriam as pessoas que tinham essa ideologia e se empenhavam em transmiti-la? Excomungadas, obviamente. Ainda, hoje, não percebo nada. Mas, depois de sabermos o que se passou, nessa Europa de Leste, quando se derruba o muro de Berlim, vemos que nunca há o branco e o preto, mas nada justificava a paranoia e a maldade do padre John.
Franklin luta com todas as suas forças até os abusadores saírem de cena. (Sabe -se, no final do filme, que o padre Mac, o dos abusos sexuais, vai para os Estados Unidos, é-lhe dada uma paróquia e ainda vive; o padre John, o torturador implacável, é mandado para África e morre em 1969).  Decide, então, abandonar o colégio, mas não resiste à despedida, particularmente, à atitude de um dos jovens a recitar-lhe poesias do livro que lhe dera. Franklin quebra. Não pode deixá-los já. Fica por mais cinco anos, alistando-se depois nas tropas aliadas. Morre, na frente de batalha, em 1944.
Para a sua luta é o fim, mas quantos começos não tinha já deixado atrás, junto dos jovens do colégio São Judas! Quantos começos não deixa, ainda, hoje, naqueles que vêem o filme e percebem a força de uma consciência! Nem tudo são entardeceres, mesmo nestes sombrios colégios. Viva o professor Franklin!