O filme fala dos meninos do reformatório de São Judas, na Irlanda, em 1939.
Revela uma realidade que, apesar da brutalidade de algumas práticas, como o
abuso sexual e a tortura física, se prolongou, por muitas décadas, em instituições
similares – e é por isso que aquela violência parece quase não nos surpreender.
Mas
há sempre um limite. Tínhamos assistido à tortura dos dois jovens, debruçados
sobre um banco comprido de madeira, rente ao chão, com o resto dos
companheiros a assistirem – tal como se torturavam, há séculos atrás, os
escravos, presos ao tronco, em espectáculo público, para que todos vissem o que
lhes podia também acontecer se ousassem desobedecer – mas não estávamos
preparados para a cena do assassínio de Liam, a quem o padre John mata à
chicotada e pontapé.
O
padre mata por motivos impossíveis de compreender. Quer saber por que apareceu
no reformatório um professor laico, William Franklin. "Será comunista"?
O
professor trata os jovens como pessoas, pelo nome próprio, promete responder às
suas perguntas e levá-los a pensar para lá de si próprios e dos muros do
colégio. Na
noite de Natal, oferece a todos uma prenda, um livro, que contém algo de
especial para cada um – poesia, literatura, teatro, vida, sentimentos,
comprometimento… Os miúdos decoram frases, versos, fazem coros, récitas,
teatros…
Algo
de novo aconteceu e o padre John não aguenta. Estes são fantasmas que se prolongam
por décadas. De algum modo, todos somos testemunhas, eu própria recordo uma
adolescência e um início da idade adulta em que o comunismo era uma palavra
maldita, como não seriam as pessoas que tinham essa ideologia e se empenhavam
em transmiti-la? Excomungadas, obviamente. Ainda, hoje, não percebo nada. Mas,
depois de sabermos o que se passou, nessa Europa de Leste, quando se derruba o
muro de Berlim, vemos que nunca há o branco e o preto, mas nada justificava a paranoia e a maldade do padre John.
Franklin
luta com todas as suas forças até os abusadores saírem de cena. (Sabe -se, no
final do filme, que o padre Mac, o dos abusos sexuais, vai para os Estados
Unidos, é-lhe dada uma paróquia e ainda vive; o padre John, o torturador implacável, é
mandado para África e morre em 1969). Decide,
então, abandonar o colégio, mas não resiste à despedida, particularmente, à
atitude de um dos jovens a recitar-lhe poesias do livro que lhe dera. Franklin
quebra. Não pode deixá-los já. Fica por mais cinco anos, alistando-se depois nas
tropas aliadas. Morre, na frente de batalha, em 1944.
Para
a sua luta é o fim, mas quantos começos não tinha já deixado atrás, junto dos
jovens do colégio São Judas! Quantos começos não deixa, ainda, hoje, naqueles
que vêem o filme e percebem a força de uma consciência! Nem tudo são
entardeceres, mesmo nestes sombrios colégios. Viva o professor Franklin!