A sala de espera
estava cheia, à nossa frente, duas senhoras conversavam sobre os netos, quando
a senhora do meu lado direito me diz: “Também, com filhos assim, quem pode
viver com eles? Acha estranho que eu diga isto - questiona-me? Sei que acha,
muita gente não entende, mas já passei por coisas… Sei bem que, quando não se
pode fazer mais nada, o melhor é deixá-los. Deixar os filhos, para não
morrermos também”.
Prossegue, olhando-me:
“Eu não conto a minha vida, se contasse! Não conto. Um filho morreu-me com trinta
e cinco anos, na cadeia, mas ninguém o matou, foi ele que se matou, com comprimidos,
davam-lhe muita medicação, tinha hepatite, sida… O outro morreu com uma
overdose, com vinte seis anos, nunca trabalhou, em vez de injectar na veia,
estava tão perdido, injectou-se fora da veia e morreu. Tenho muito para contar,
mas não conto. Criticam-me por não ter chorado a morte dos meus filhos, não
choro, sei que foi o melhor que aconteceu a mim e a eles”.
Sigo o que diz, com
o olhar e expressões de circunstância: “é assim, a vida é assim, não se pode
fazer nada… Não faço qualquer pergunta, mas ela continua: “O mais velho teve
filhos, tenho netos…”. Penso: como estará esta mulher por dentro? Olhando-a,
ninguém diria que uma tragédia (ou várias) a consomem, mesmo que repita mil
vezes que não quer falar, que foi melhor assim.
E como estará, por
dentro, a senhora do meu lado esquerdo? E a que está à minha frente? E a que
está atrás de mim? Que sabemos uns dos outros?