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quinta-feira, 4 de janeiro de 2018

Agir a favor da paz, aqui e agora

A contradição do humano: tantos votos de paz e ao mesmo tempo tanta violência. Celebrou-se a 1 de janeiro o dia mundial da paz. O Papa enviou uma mensagem a todos os católicos, o diretor geral da ONU a todo o mundo, ambos, alertando para os perigos e pedindo (exigindo) que mudemos de atitudes. Mas talvez, tudo continue irremediavelmente na mesma.
Claro que a violência tem muitas caras, muitos graus, muito confronto de interesses e muito domínio de uns sobre outros. Não podemos pensar apenas nas guerras, na fome, nas perseguições, nas limpezas étnicas, nos delírios dos que continuam a ameaça nuclear…, temos de pensar nos desempregados, nos que, mesmo trabalhando, não ganham para pagar as contas, dos jovens que saem à noite e morrem baleados à porta de uma discoteca, da violência doméstica, dos que todos os dias ou nos mentem ou nos dizem meias verdades, dos que nos atendem mal num serviço público ou privado…. Reagir em nome da dignidade e da justiça é já uma atitude a favor da paz de cada um e de todos os outros.


quinta-feira, 28 de dezembro de 2017

Um mundo menos desigual, é possível

Não é possível não sentir um desconforto, ficar insensível à vida de tanta gente marcada por um destino que lhe determina os dias. Não é possível compreender que alguns vivam junto a um mar onde nunca tomarão banho, arrumem quartos em hotéis onde nunca poderão dormir, sirvam em restaurantes onde nunca  comerão uma refeição sentados na sala...
Não é possível aceitar um desenvolvimento tão desequilibrado, onde a par dos maiores luxos subsistem as maiores dificuldades e as maiores carências. Um desenvolvimento assim, devia envergonhar todos os poderosos do mundo. Nem tudo é economia, senhores; nem tudo são índices macro económicos; olhemos para a vida quotidiana das pessoas concretas.
Se algum voto faço para 2018 é a de um mundo menos  desigual.



quarta-feira, 27 de dezembro de 2017

A violência que não desaparece


Por mais leis e quadros jurídicos que possam existir, não será possível, acabar com o mal e a violência que nos rodeia, a não ser por escolha ética. O mal é da natureza humana. Somos todos capazes de ser bons e maus, santos e demónios, vítimas e carrascos, explorados e exploradores..., como se existisse uma falha originária que nos impedisse de reconhecer o outro, seja quem for, como um individuo único e irrepetível a quem devemos respeito. A atitude é sempre de alerta e a ação é sempre a da responsabilidade individual: o que escolho fazer perante aquele a quem acolho e a quem devo respostas? 

terça-feira, 26 de dezembro de 2017

Um dia, talvez, terminem todas as atitudes racistas

Eu, também


Também eu canto a América
Sou eu o mais preto dos irmãos.
Mandam-me comer na cozinha
Quando chegam as visitas,
Mas eu rio,
E como bem,
E forte vou crescendo.

Amanhã,
Estarei à mesa
Quando as visitas chegarem.
Ninguém ousará
Dizer-me
Come na cozinha,
Então.

Aliás,
Eles verão como sou belo
E envergonhar-se-ão.
Também eu sou a América.

(saiu na Revista Pública de 14 de Outubro de 2001, retirado de Langston Hughes, 1925, Collected Poems)


sexta-feira, 22 de dezembro de 2017

Boas Festas

Desejo a todos, os que por aqui passam, um Bom Natal e um Bom Ano de 2018.

Deixo um poema, sobre  o racismo, ainda hoje a maior das discriminações:

É proibido publicar

Seria aborrecido se Cristo
Voltasse, e fosse preto.
Há tantas igrejas
Onde não poderia rezar
Nos Estados Unidos
Em que o acesso dos negros
Por santos que sejam, é proibido.
Em que se celebra
Não a religião
Mas a raça.
Experimentai dizê-lo
E pode ser que sejais
Crucificados.

(Langston Hugges, 1902-1967, Estados Unidos da América)


quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

História de um encontro (4)

Ela sabe que se pegar no telefone e disser onde está voltará ainda hoje para casa. Sabe isso, mas sabe também que de novo voltará a fugir sem saber de quê ou de quem. Ele, ao contrário, sabe que não vai pegar no telefone, nem voltar para casa. Ela não quer, ele não pode, a situação é diferente.
Estranha sensação. Apesar de diferentes as situações e distintos os problemas há um sentimento comum de rejeição que ambos vivem. Num caso há desequilíbrio e incompreensão, no noutro há uma rejeição que destrói sentimentos. Ao velho, isso dói profundamente, sente-se humilhado e nada é pior do que isso. Ela sente que é rejeitada pelas suas opções que ninguém a entende e todos criticam. Ambos precisam que cuidem e se preocupem com eles.



domingo, 17 de dezembro de 2017

História de um encontro (3)

Olhando aquela adolescente, que podia ser sua neta, pensava: "que mundo é este, que sociedade é esta, onde não há lugar para os velhos e as crianças fogem de casa? Que vida familiar é esta que exclui os velhos e não tem tempo para ajudar os filhos a crescer e a viver a difícil adolescência. Que mundo é este em que tantos estão sozinhos, apesar das multidões e do excesso de comunicação"? O velho não foi capaz de conter as suas emoções e de calar os seus sentimentos. Sem querer, começou a chorar.
- Estás a chorar? - diz-lhe a jovem, olhando-o e tocando-lhe no rosto.
Também ela se comoveu, pela primeira vez, fala com ternura na voz, num misto de surpresa e de compaixão, afinal ele parecia sofrer tanto ou mais do que ela.
- Olha, eu sou a Cláudia, queres vir comigo? Levo-te para uma casa, já fora da cidade, onde vive uma amiga e onde às vezes costumo ficar. Anda, vem, vem...
Arrastado por ela, o velho deixa-se conduzir para fora da estação, sem perguntas, mas observando e pensando sempre.  Cláudia, ora corria, ora parava, dizendo coisas sem sentido - a contradição presente em alguém que sente raiva e culpa, por uma liberdade que quer e julga ter conseguido, mas que não lhe serve para nada, antes, a maltrata e prejudica. Cláudia não é capaz de cuidar de si, hoje, como em muitas outras noites, terminará no beco de sempre, prostituindo-se, bebendo ou consumindo outra droga qualquer, apesar da idade.
O velho pressente a situação mas não é capaz de dizer nada. Não é capaz. Que coisa é essa que o impede de dizer seja o que for ao mesmo tempo que questiona: «Para que quer Cláudia a liberdade se não sabe ou não pode ser livre».