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sábado, 29 de abril de 2017

Viagem à Índia (2)



Em viagens turísticas, como a que fiz, só vemos uma parte (pequena) da realidade. Temos a sensação de viajar dentro de uma bolha. Preservados de tudo, em hotéis bons, autocarros novos, com ar condicionado, motorista, guia e ajudante, cumprindo um roteiro que não deixa muita margem a iniciativas individuais.
Devem existir ruas, mercados, praças..., onde a multidão seja visível, mas, nesta viagem, nunca pude observá-la. Onde estão os milhões de indianos? Onde estão “presos”? Quem os "prende"?
Há coisas que impressionam pela grandiosidade: as fortificações mongóis, com vários palácios dentro, as cidades abandonadas, os monumentos como o Taj Mahal, marcas de uma Índia estratificada de há duzentos ou trezentos anos: os reis e a plebe, os marajás e o povo.
Mas, para mim, foi particularmente intrigante a visita panorâmica a Nova Deli, depois de uma manhã a visitar os monumentos da antiga cidade. Quase tudo é herança britânica, uma cidade administrativa, monumental, com grandes avenidas, um arco de triunfo, praças..., muitos parques verdes, zonas residenciais, palacetes individuais, em zonas fechadas, onde, antes, viviam os funcionários da coroa, hoje, destinados a serviços do Estado. 
Quando passamos junto aos edifícios do Estado, palácios do presidente e do 1º ministro, ministérios, parlamento..., o guia avisa: “aqui não se pode parar, nem descer, aqui, nenhum carro particular pode circular, nós passamos, porque é turismo. Só duas vezes por ano (em dias nacionais) as pessoas comuns podem visitar esta parte da cidade".
Afinal, Nova Deli (ou parte) é uma cidade proibida, para o comum dos indianos; aberta, sem muralhas, mas vigiada, destinada a governantes, políticos, funcionários e afins... Não se compreende.

sábado, 25 de junho de 2016

Pessoas e sentimentos

Queria tanto escrever de forma simples, sobre  coisas importantes, mas não sou capaz. Vivo enredada  em conceitos, teorias..., que servem para muito pouco, porque nada é mais importante que a vida concreta de pessoas concretas, que riem, choram, amam, desprezam, sentem raiva, compaixão...; pessoas reais, afinal de contas.

segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

A interação é o fulcro

As vidas, as origens, os percursos..., podem ser e são muito diferentes, mas quando olhamos alguém, por mais estranho e desconhecido que seja, em qualquer ponto da cidade ou do mundo, a expectativa que temos é a de que se trata de alguém com autonomia, significados de vida boa,  ou seja, quando sorrio, cumprimento, dirijo a palavra a alguém, espero reciprocidade. Espero que me sorriam, cumprimentem, falem... Espero poder interagir.

quinta-feira, 2 de abril de 2015

As raparigas ciganas

Aconteceu pela Páscoa (há muito tempo). Penso que seriam duas ou três jovens mulheres ciganas, carregadas de filhos, uns ao colo, ainda bebés, e outros, também de curta idade, agarrados às longas saias. Bateram-me à porta a pedir esmola.
- Senhora dê-nos alguma coisinha, nasceu um menino no acampamento, esta noite, e a mãe está muito mal e não temos nada para lhe dar.
- Mas, o que posso dar?
- Podia dar-nos um bocadinho de azeite, um bocadinho de pão, arroz ou batatas, para fazer uma miga ou uma sopa, não temos nada.
- Não sei se tenho, vou ver.
- Pela sua saúde, pelas alminhas que lá tem, dê-nos alguma coisa, o azeite é o que mais precisamos.
Não sei por quê, mas para mim o pedido era verdadeiro, não me passava pela cabeça que estavam a mentir e que aquela era mais uma estratégia de pedir esmola. 
Acreditei. Fui buscar o azeite, como já não era muito, dei-lhes a garrafa. Não tinha pão, dei-lhes algum arroz e algumas batatas. Agradeceram e foram embora.
Fiquei a pensar, o dia todo, naquela rapariga que tinha tido um filho, em condições sub-humanas no acampamento da beira da estrada e no perigo que corria, ela e o seu bebé. Mesmo que, naquele caso, pudesse ter sido uma história, a realidade era essa: nascer à beira da estrada, sem quaisquer condições, sem quaisquer direitos. 

segunda-feira, 9 de março de 2015

Perder a alma

Nem todos perdem a alma da mesma maneira. Alguns não perdem, porque não a têm. Sem valores, sem sentimentos, agem no limite da  animalidade. 
Fazem tudo, roubam, batem, torturam, matam…, voltam a matar…como se nada fosse, como se nada se passasse, voltando às suas vidas criminosas, sempre da mesma maneira, sem qualquer consciência. Por que chegaram a este ponto? Por que chegaram aqui? Não sabemos. 
Outros ficam loucos, perdem a alma, já não sabem quem são, vivem um  inferno que lhes rouba a  paz e tortura os dias. 

sexta-feira, 6 de março de 2015

Emigrante

No cais há um vai e vem contínuo; uns partem, despedem-se, desejam saúde e sorte por lá, de rosto fechado, às vezes em lágrimas; outros reencontram-se, enchem-se de felicidade, há sorrisos e alegria.
Aquele homem, afastado de todos, sofria. Fingia uma força que não tinha: “trabalho na Alemanha, por lá a vida corre bem, mas o pior é deixar a mulher e os filhos”- diz-me.
Muitos dos que entraram vão à janela acenar aos que ficam, enquanto o comboio se afasta mais e mais. Ele não deixou ninguém no cais, não tem a quem acenar, sente-se exausto, cai no assento, abandona-se, procurando não pensar. Até daqui a um ano, se vier, haverá tempo para milhares de vezes rever na mente todas as pessoas e paisagens que deixa atrás e que agora se recusa a olhar. Recolhe-se a um lugar, onde há uma proximidade e uma presença que só ele conhece.
Já não está ali, apesar de estar. Regressou à sua casa, à mesa com os filhos, às conversas entrecortadas, inacabadas, aos gestos e aos mimos dos que ama. Parte, sem partir. Quase nunca estamos onde vivemos, pisamos as ruas, subimos escadas…, estamos onde sentimos um existir que nos preenche por dentro.
Passará tempo, até voltar a abrir os olhos e a perguntar ao vizinho do lado: “também vai para a Alemanha?”
- Não, vou para França.
França, Alemanha, tanto dá. Tantos destinos, tantas paragens, tanto descer e subir. Era assim nos anos setenta do século passado. É assim (ainda hoje é).


quinta-feira, 5 de março de 2015

A jovem moçambicana

Ali ficou, em soluços, assustada, perdida, à espera que a tia chegasse. A vulnerabilidade da jovem era tão evidente, apesar dos seus catorze anos! Chorava convulsivamente, agarrada a mim, que desci do autocarro para a ajudar, como que a implorar: “não me deixem aqui, sozinha”. Mas, como fazer? Tínhamos, eu a amiga, de continuar viagem até Maputo. Quando não viu a tia, como estava combinado, e não reconheceu o sítio, entrou em pânico.
O problema era se havia outra paragem e se desencontravam. Teria ficado no sítio certo? A minha preocupação diminuiu, ao pensar que, numa localidade tão pequena, a tia iria procurá-la e facilmente a encontraria. Talvez se tivesse atrasado, apenas. Digo-lhe: “telefona à tua tia, a dizer que já chegaste”. “Não tenho saldo – é comum toda a gente andar de telemóvel na mão, mas poucos terem saldo) - responde-me.
“Não te preocupes, vamos já telefonar à tua tia, saber se foi atraso ou o que se passou”. Assim foi, a amiga telefonou à tia e ficámos com a certeza de que as duas se encontrariam dentro de instantes.  
O que se passaria com esta jovem, tão impreparada para a vida, tão assustada? Afinal, não conhecia Macia, embora, sempre dissesse: “sou de Macia, a caminho de Maputo”. Mas essa não podia ser a razão para tamanho descontrolo. Que medos e dúvidas a invadiam? Não sei, mas não podem ser pequenos.