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segunda-feira, 31 de julho de 2017

O senhor Maduro, Venezuela

A cartilha  ideológica,  a gritaria,  a impossibilidade de perceber o fundamental, levam o  país para o abismo. Não sei se são os homens que mudam, se são as circunstâncias que os  obrigam a mudar, sei  que o poder transforma, corrompe, embebeda. Maduro é a face visível de uma ditadura,  a fome, a violência e a falta de liberdade mostram  um caos social e político que tem tudo para se agravar.

sábado, 29 de julho de 2017

O velho escravo deseja a morte

Só tens preço, se tens força, se dás lucro, nas plantações, nos engenhos...; embora não possas pôr um pé fora do carreiro e das ordens do patrão, tens comida; mas se já não aguentas trabalhar, arrastas-te, como podes, com doenças e misérias sempre em maior número.

Tudo é indigno, desmedidamente repugnante; há o cá e o lá, o abismo de dois mundos, onde só um tem direitos, dita as leis, decide da vida de tantos seres humanos; o abismo entre o ser e o não ser, entre a existência e a sobrevivência mais absolutas, acentua-se.

O homem velho entra na cabana, abraça a mulher e chora, chora convulsivamente, chora por tudo e por todos, sente-se gente. O amor de alguém é a única coisa que parece restar-lhe. O amor de alguém, sentimento profundo, às vezes, decisivo, por isso, se vive, se sobrevive, se aguenta.

Mas há sempre um limite, resta o silêncio, um imenso silêncio; o velho escravo deseja a morte.

segunda-feira, 24 de julho de 2017

"Primeiro o senhor", princípio das relações humanas

Quem são as pessoas que me interpelam? São pessoas concretas, com vidas concretas, algumas, até, pessoas a quem julgo conhecer bem e de quem, aparentemente, poderia falar, mas por mais que eu pudesse dizer acerca delas, nunca diria verdadeiramente quem são.
O outro é sempre uma alteridade, uma separação, é e permanecerá um desconhecido. Contudo, não se trata de uma ficção minha, está ali, fala-me, interpela-me, exigindo-me respostas. E eu o que faço? Posso decidir responder ou continuar instalada, desatenta, como se nada fosse, ou posso agir, aproximar-me, responder ao apelo.
A escolha é minha, a questão é decididamente ética, sou eu que decido se quero ou não o encontro face a face com o outro.

sábado, 22 de julho de 2017

Os ciganos de Loures, todos os ciganos

Sempre a forma e o tom importam ao conteúdo, mas este é o mais importante. Sou contra a discriminação de qualquer minoria; sei que os ciganos são, em Portugal, muito estigmatizados, a todos os níveis e também na escola. Já, há uns anos atrás, juntamente com outras pessoas, fiz um trabalho e um encontro para tentarmos perceber a realidade dos alunos ciganos e o resultado não foi animador.
Os ciganos  têm, como todos os outros cidadãos portugueses, direitos e deveres, isto a mim parece-me claro,  a questão é conjugar isto com aspetos culturais próprios que, em grande medida, definem a sua identidade.

domingo, 25 de junho de 2017

Tagore, poeta indiano

As raízes
são ramos debaixo da terra;
os ramos, raízes no ar.


Os montes são gritos de meninos,
que levantam os braços
porque querem as estrelas.

( aforismos, in O coração da Primavera, Tagore)

sexta-feira, 9 de junho de 2017

Os falsificadores, o filme

É um filme sobre a falsificação da libra esterlina pelos nazis que se preparavam, também, para falsificar o dólar americano, já, no final da II Guerra Mundial.

Um grupo de judeus é deportado para um campo alemão, onde se dedicam à falsificação de moeda. O falsificador foi preso em Berlim pelas SS e levado para esse campo para se aproveitarem das suas habilidades; o mesmo aconteceu com todos os outros, uns percebiam de tipografia, outros de grafismo, outros de dinheiro e de bancos…. Era assim, sempre que os prisioneiros tinham capacidades de trabalho que interessavam à estratégia nazi, eram poupados à morte.

Este falsificador é tratado com alguma deferência, os alemães sabem bem que precisam dele e por isso dão-lhe condições de trabalho, materiais, ajudantes… para que se torne num falsificador perfeito. No grupo, há diferentes sentimentos: uns querem conspirar contra os alemães e negarem-se a colaborar; outros fazem tudo para sobreviver, quando pensam no fuzilamento imediato, se ousassem fugir e fossem apanhados. Uns deixam a sua parte psicológica arruinar-lhes os dias, outros continuam cerebrais e manipuladores, fazendo o jogo do inimigo, não deixando que lhes aprisionem o pensamento – é o caso do falsificador. Tem consciência do seu valor para os alemães e permite-se esticar a corda, até um dia.

Durante muito tempo, vai enredando, para evitar colaborar na falsificação do dólar, dá desculpas: é a gelatina, é o papel, é a máquina tal...; enfim, o comandante do campo percebe, mas não pode fazer muito mais, pressiona-o, porque também é pressionado. Ameaça-o: “há quem o substitua, não é o único a falsificar notas”!
O falsificador resiste. Tem um olhar de dureza que, às vezes, perturba; mas, mesmo sem quebrar, pressente-se que vive um tormento interior, por exemplo, quando um dos jovens do grupo adoece, gravemente. É visto pelo médico do campo, pensa-se que é tuberculose, mas não há medicamentos; o falsificador vai fazer tudo para os conseguir. Vai a casa do SS, o comandante do campo, com a receita, e pede-lhe: “arranje-me estes remédios e em troca falsificarei o dólar. Se encontrar os medicamentos, arranjarei maneira de falsificar o dólar”. E o comandante arranjou-os.
Entretanto, os russos tomam Berlim, os nazis destroem o campo e as máquinas de falsificar moeda, para que não se soubesse o que ali se fazia.
Na realidade, os judeus desse campo fogem, no fim da guerra, numa carruagem, são intercetados e presos, mas libertos, algum tempo, depois; alguns ainda vivem.
O filme começa com o falsificador numa praia, no Mónaco, depois de perder uma grande quantia de dinheiro no casino e termina, no mesmo sítio, agora, já com uma jovem bailarina que lhe diz: “foi muito o dinheiro que perdeu”! “O dinheiro não é problema – responde-lhe”.

Talvez, o mais forte do filme tenha sido ver o falsificador disposto a tudo, para salvar o jovem russo; a força duma amizade e o sentido profundo de uma identidade (cultural, religiosa…) são inexplicáveis.   



quarta-feira, 7 de junho de 2017

Quem tem medo de Virgínia Woolf?

Fui ver a peça, ao teatro da Trindade, Lisboa, e confesso que não me senti completamente confortável. Tudo se passa na sala de estar do casal, George e Martha, depois de uma festa na universidade do pai de Martha, onde o marido é professor de História, primeiro, esperando o jovem casal, ele é o novo professor de Biologia, que dormirá essa noite em casa deles, depois, os quatro em cena.
O ambiente é excessivo, doentio, quase esquizofrénico; expõem-se, de forma crua, raivas, não ditos, aparências, futilidades..., para humilhar, simplesmente, numa escalada, que parece sem retorno. A humilhação é o pior dos males; humilhar alguém, é anular a sua autonomia, a sua estima, a sua liberdade; é dizer: "não és nada, não vales nada; posso pisar-te, vou pisar-te"; melhor ainda, se houver assistência, no caso, a do jovem casal - durante uma parte da peça, Martha faz isto com mestria.
Mas, George, apesar da humilhação da mulher, também não é santo, é ele que serve: “mais uma bebida, mais uma bebida”…; é ele que antevê e incita à traição da mulher com o jovem professor, é ele que cria jogos de linguagem e de poder (na verdade, só ele não está perdido de bêbado), para os levar a confessarem o que na realidade são. E ele, nesse jogo, quem é na realidade? E o filho, morreu ou nunca existiu?
 Certo é que, depois, dessa noite de bebedeira, é muito álcool, o casal voltará à mesma violência emocional, às mesmas realidades ou ilusões, nunca se percebe muito bem, em que aprendeu a viver, como se estivesse preso numa teia.