Naquele
ano, a Vera ia ser minha aluna. Tinha prometido a mim própria que iria fazer
tudo o que fosse possível por ela. Mas, fazer tudo, talvez não fosse
muito. Tentaria, disso tinha a certeza. Comecei a dar-lhe toda a atenção, a
pedir-lhe ajuda para pequenas coisas, e a Vera começou a dizer algumas palavras:
os livros, o quadro, a pasta…, até que, pouco a pouco, começou a dizer frases
completas: - é para ir buscar os livros da professora? É para apagar o quadro?
É para procurar dentro da pasta? ... E assim se foi integrando, mas sempre
muito dependente de mim, como se eu lhe desse uma segurança que não tinha em
mais lado nenhum. Mesmo nos intervalos queria sempre ficar na sala. Muitas
vezes, eu saia por causa dela, mas continuava a segurar-me a mão, vejo isso
ainda agora quando olho fotografias de dias de festa tiradas nesses tempos de
escola.
A Vera estava presa a mim, e eu a ela. Esteve comigo dois anos, por fim falava de
tudo, dos irmãos, do pai, da mãe, da casa, do irmão que ia nascer…, parecia
outra, já não era a menina assustada e triste, mas dependia demasiado de mim,
da minha atenção, mas eu também dependia dela. Estranha relação... A mim
magoou-me ter de lhe dizer adeus. Não sei o que se passou a seguir, gosto de
pensar que se tornou um menina mais autónoma e mais feliz. Ajudaste-me
tanto, Vera! Sabes, continuas a fazer-me falta.