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quarta-feira, 4 de maio de 2022

O guardador de gado


Quando ficou órfão, foi levado para casa de um senhor que, em vez de o criar como se devem criar as crianças, o pôs a guardar gado, quase numa espécie de escravatura.
- Tenho 12 anos, vivo em Massinga (Moçambique) e guardo gado - disse-me.
- Tens um grande o rebanho! Sabes, quantas cabeças são?
- Não sei quantas cabeças de gado guardo, porque não sei contar, nunca fui à escola. O rebanho é da família, a maior parte, mas também é de outras pessoas, tenho de ir duas vezes ao rio, de manhã e à tarde, para poderem beber água. Tenho inveja dos meninos que vão a escola.
- Talvez, um dia ainda possas ir à escola!
Fico a pensar em todos os meninos que guardam gado e nunca foram à escola.

sábado, 3 de maio de 2014

A menina egípcia que vendia marcadores de papiro (8)

Não sei bem, mas eram, seguramente, mais de uma dezena de crianças que vendiam marcadores e outros pequenos objectos, junto a uma fábrica de transformação de papiro, onde os turistas param para observar o processo de produção e fazer compras.
Era uma menina muito bonita! Não tinha mais de seis ou sete anos, no máximo. Muito pequenina, muito esperta, vestidinha à árabe a vender aos turistas marcadores de papiro. Contava, na perfeição, em inglês, francês, espanhol, e repetia, sem parar, os números até doze, número que correspondia ao “molhinho” de marcadores que vendia por um dólar.
Toda a gente, literalmente toda, enquanto eu estive a observar, lhe comprou os marcadores. Ela era o centro de todas as atenções, impossível não a fixar, pela graça, pela desenvoltura, pelo modo como uma criança, tão pequena e tão linda, contava marcadores de papiro.
A mãe vigiava-a, por perto, mas mesmo assim não evitava que os “maiorzinhos” não achassem piada à freguesia que conseguia atrair e lhe dessem encontrões, a obrigassem a sair da frente e a sentassem a um canto. Por um lado, percebo, ela tirava-lhes todo o negócio, conseguia todas as atenções. Mas continuava. Contava, repetidamente, sem parar, não desistia, e isso foi o mais impressionante, não desistiu nunca, a determinada altura chorava convulsivamente, lágrimas rosto abaixo, mas continuava: one two, three, …e mais um molhinho de marcadores, e outro, e outro e mais outro … .
- Minha menina, não podes brilhar tanto! Tens de deixar os outros também vender. Vá lá, tem de ser assim! Não te dão encontrões e socos por não gostarem de ti, apenas porque não suportam não vender nada aos turistas que param junto a fábrica de transformação do papiro. Vai descansar um pouco, cuidar da tua voz, já rouca de tanto apregoar marcadores de papiro, deixa os outros meninos também venderem um bocadinho. Não quero ver-te chorar mais!

                                                                                     Agosto, 2005, arredores do Cairo 

segunda-feira, 21 de abril de 2014

Crianças e jovens que conheci (4) - O menino árabe

- Um dólar, um dólar, um euro, um euro …, madame, madame, señora, señora! - Eram meninos de sete, oito, nove anos que traziam pequenos objectos que tinham feito com ramos de palmeira entrelaçados: cestinhas, flores, pássaros, e não sei que mais.
Dão os objectos (na realidade, pretendem vender) a uma senhora, a outra e a outra, até ficarem sem nenhum. Quando eu quero comprar, um dos meninos, muito rapidamente, começa a tecer alguma coisa, mas, como já não havia tempo, entrega-ma, tal qual, e diz-me: - É um pájaro, é um pájaro (é um pássaro, é um pássaro)! 
- Querido menino, como é um pássaro!
- Não vê já a cabeça? Não está terminado, mas é um pássaro. A senhora se quiser vê um pássaro – diz-me num espanhol imperfeito, mas que entendi perfeitamente.

- É um pássaro, sim! Como não é um pássaro? Tens razão, já o vejo. 
A porta do autocarro fecha-se e o menino acena-me contente, por ter conseguido a moeda. Fico emocionada e penso na história do Principezinho, será que alguma vez este menino ouviu falar do principezinho e da ovelha dentro da caixa com buracos: “a ovelha que tu queres, está lá dentro”. 
Igual. O pássaro que eu quero, está aqui, neste projecto de pássaro. É só imaginar: grande, pequeno, de poucas ou muitas cores, depende do que eu desejar. Apetece-me dizer-te: - Não voltes a fazer pássaros completos, faz pássaros para os outros imaginarem, para os outros sonharem. Sim, que imaginar também é ver.
(Agosto, 2002, no palmeiral de Marraquexe)

sábado, 16 de junho de 2012

12 de Junho, dia mundial contra o trabalho infantil

“Gostava de vestir o uniforme e de ir à escola”, diz Sheila, uma menina indiana, de doze anos, que trabalha numa fábrica de tapetes para ajudar a  família.
Para quem as contrata e explora o que interessa é terem à disposição dedos pequeninos como os de Sheila que entrelacem fios demasiado finos em desenhos minuciosos. São crianças como ela que repetem, infinitamente, gestos iguais para que tudo saia perfeito e surjam aquelas obras de arte. Mas a que preço!
São crianças como ela que ficam com insuportáveis dores no corpo e marcas para toda a vida, enquanto, nas casas e palácios de gente rica, ninguém pense, ao pisar uma dessas carpetes, quem as teceu e em que condições. Não é isso, o que lhes interessa!
Mas, a nós é isso que interessa, são os direitos das crianças e a sua vida o que aqui está em causa. Lutar contra o trabalho infantil, é uma obrigação e uma responsabilidade de todos.
Querida Sheila, espero que possas deixar o trabalho na fábrica, vistas de novo o uniforme e regresses à escola. Imagino-te, correndo pelo pátio, de livros na mão, dizendo bom dia à vida. Mereces isso, tu e todas as crianças do mundo que são obrigadas a trabalhar antes do tempo. E são muitas!