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quinta-feira, 23 de fevereiro de 2023

Escravatura: seres humanos escravizados

 Claro que as palavras magoam, discriminam, ofendem, humilham….

Ouvir dizer: «É descendente de escravos» ou: «Tem sangue negro», como se houvesse uma essência humana negra, como se a natureza dos negros não fosse igual à dos outros seres humanos.

Não há uma essência negra! Há, simplesmente, seres humanos!
Ninguém é descendente de escravos; ninguém tem sangue escravo.
Os negros descendem de seres humanos escravizados, de pessoas que alguém escravizou.


Escravatura, séc. XV e séc. XVI (Foto: Ensina, RTP)

quarta-feira, 4 de maio de 2022

O guardador de gado


Quando ficou órfão, foi levado para casa de um senhor que, em vez de o criar como se devem criar as crianças, o pôs a guardar gado, quase numa espécie de escravatura.
- Tenho 12 anos, vivo em Massinga (Moçambique) e guardo gado - disse-me.
- Tens um grande o rebanho! Sabes, quantas cabeças são?
- Não sei quantas cabeças de gado guardo, porque não sei contar, nunca fui à escola. O rebanho é da família, a maior parte, mas também é de outras pessoas, tenho de ir duas vezes ao rio, de manhã e à tarde, para poderem beber água. Tenho inveja dos meninos que vão a escola.
- Talvez, um dia ainda possas ir à escola!
Fico a pensar em todos os meninos que guardam gado e nunca foram à escola.

quarta-feira, 5 de maio de 2021

Os trabalhadores migrantes em Odemira…

 São trabalhadores agrícolas, na maioria asiáticos, vindos do Bangladesh, Nepal, Índia, Tailândia… e vivem em Portugal em condições desumanas.  

Dormindo amontoados, em beliches e colchões que pela noite estendem no chão e pela manhã levantam e encostam às paredes para deixarem algum espaço livre e poderem movimentar-se, partilhando cozinhas e casas de banho minúsculas e degradadas.

Muita gente sabia destas condições, mas nada fez; são muitos a lucrar, já se viu pelas denúncias dos últimos dias. São tantos os intermediários de que falam, máfias criminosas, grupos organizados que exploram os trabalhadores cá e nos países de origem.

 

sexta-feira, 3 de julho de 2020

A escravatura (5)

Há sempre consciências que elevam a sua voz, em nome dos sem nome, contra todas as indignidades. Foi assim que surgiu o abolicionismo - movimento político contra a escravatura que  faz o seu caminho e se impõe em meados do século XIX.
A abolição da escravatura  em Portugal foi em 1761 e em todo o império português em 1854. Nos Estados Unidos a escravatura termina em 1863, mas não terminou a segregação dos negros, como acontecimentos recentes mostram à evidência; negros continuam a ser mortos às mãos de polícias racistas.
 . 

terça-feira, 30 de junho de 2020

A escravatura (4)

Um dos destinos do tráfico negreiro foi o Brasil, primeiro os portugueses, na 2ª metade do século XVI e depois os holandeses. Levavam escravos das colónias africanas para as senzalas,  onde viviam sem quaisquer direitos, com tortura física e psicológica, acorrentados para evitar fugas.
As rotas de escravos foi um negócio consentido, entre os reinos africanos e árabes e os países europeus, em muitos destes países, durou até há bem pouco tempo, a Mauritânia foi último país a abolir a escravatura, apenas, em 1981.
Mas a escravatura não ficou enterrada na história, continua nos nossos dias, não tenhamos ilusões; continua depois da Declaração Universal dos Direitos Humanos e tantos tratados e acordos internacionais .

sábado, 27 de junho de 2020

A escravatura (3)

 Com os descobrimentos e particularmente com o povoamento das Américas, a escravatura e o tráfico de pessoas toma uma dimensão avassaladora e incomensurável que ainda hoje se sente. Quando visitamos fortalezas, que foram outrora entrepostos de escravos, há um arrepio que nos atravessa o corpo e nos comove até ao mais profundo de nós mesmos.
Como foi possível que milhões de seres humanos tivessem sido reduzidos à condição de escravos, arrancados às suas famílias, às suas terras e embarcados, em condições sub-humanas, em navios negreiros, para irem para o outro lado do mundo!
Cruzavam o Atlântico, em viagens de desespero e morte,  cerca de 40% não sobrevivia, para serem utilizados como força de trabalho, nas plantações de café, nos engenhos de açúcar ou nas explorações mineiras.

terça-feira, 16 de abril de 2019

Escravatura (4)


O silêncio imposto aos que assistem não pode ser mais perturbador, ainda que os olhos, rasos de água, denunciem a tristeza e a raiva que os consomem por dentro. A que ponto chegam as leis inumanas e a demência de alguns!
Mas, nenhum destes homens deixou de ser gente, e alguns são fortes, muito fortes – é que há alturas em que uma pessoa não pode mais continuar de cabeça baixa – e ousam enfrentar o senhor: reúnem-se, combinam, planeiam a fuga. 
Lá fora, estão os quilombos. Lá fora, está a liberdade, sempre sonhada, mas quase nunca possível. Quem poderá ajudá-los? Talvez, alguns negros já libertados, talvez algum abolicionista. Esperam. Resistem.


terça-feira, 9 de abril de 2019

Escravatura (2)

Durante quatro séculos, milhões de seres humanos cruzaram o Atlântico, de África para as Américas, em viagens de desespero e de morte, onde cerca de 40% morriam. Os que sobreviviam eram utilizados como força de trabalho, nas plantações de café, nos engenhos de açúcar ou em outras explorações agrícolas ou mineiras. Um dos destinos mais marcantes, foi o Brasil; primeiro com os portugueses, na 2ª metade do século XVI, depois com os holandeses que levavam escravos das colónias africanas, para as senzalas brasileiras (aquela espécie de casa), onde viviam, sem quaisquer direitos, torturados e acorrentados, de onde só saiam para trabalhar. Foi assim até quase finais do século XIX.


sexta-feira, 7 de setembro de 2012

Encontro em Goreia



Goreia, ilha frente a Dakar, funcionou como entreposto de escravos, durante mais de três séculos. Daí, entre quinze a vinte milhões de escravos devem ter embarcado em barcos negreiros, com destino à América, ao Brasil ou às ilhas do Caribe. Destes, mais de 6 milhões morreram na travessia, tal as condições miseráveis em que eram transportados, nos porões, como gado.
Partiam, deixando, tudo, atrás. Até o próprio nome, eram já números quando embarcavam e números quando chegavam aos cafezais, aos campos de algodão ou às plantações de açúcar. Aí, passavam a usar nomes americanos, se iam para a América, portugueses, se iam para o Brasil, ou espanhóis, se iam para o Caribe.
Ao serem roubados do nome africano, muitos descendentes destes escravos negros não sabem de onde vieram, nem como procurar as suas raízes, mesmo que o queiram fazer.
No entanto, há uma identidade africana, profunda, que permanece, mesmo que silenciosa. Uma noção de pertença que sobrevive a muito, a quase tudo, a séculos de exploração e de afastamento.
“Estou aqui pela primeira vez, mas é como se estivesse cá estado desde sempre, sou de África”, diz a jovem americana, integrante de um grupo de música afro jazz que junta músicos de diferentes origens – americanos, africanos, europeus… - para, juntos, reinventarem, uma alma, um espírito, que não exclua raças nem culturas.
“Onde estarão as minhas raízes? Talvez, estejam nalgum destes países da costa ocidental africana. Talvez, a minha tetra avó ou, antes dela, outro antepassado meu, tenha chorado nesse cais ao vir-se despedir do filho, do marido ou de outro familiar próximo”. Abeira-se dela uma jovem que lhe fala como se a conhecesse desde sempre: “ Olá, também sou cantora, também canto jazz” (não se sabe se sim, se não, pode ser uma estratégia de aproximação), mas que afinal resulta.
- Ah, sim!
- Sou a Amina, não esqueças, Amina. Sou daqui, de Dakar. E tu?
- Sou de Nova Orleães, Estados Unidos.
- Vou cantar uma canção para ti. Queres ouvir?
A americana faz gestos de incredibilidade, não esperava aquela atitude.
- É bonita – diz, sorrindo!
- Canta também uma música para mim – pede-lhe a africana de Dakar.
- Não, nunca canto fora dos espetáculos, só no duche.
- Canta, também cantei para ti.
Tenta lembrar-se de alguma canção e canta uns versos.
- Bonita, vais cantá-la no teatro?
- Não, esta não a canto, hoje, à noite. Cantei-a só para ti.
- Acabamos de nos conhecer e quem sabe se não nos voltamos a ver algum dia. O mundo é um “panuelo”, muito pequeno, podemos encontrar-nos. Talvez vá para a América, cante num clube de jazz e até no teu grupo…  
- Quem sabe, quem sabe...
A africana de Nova Orleães não quer acreditar no que acaba de lhe acontecer. Quando lhe perguntam o que se passou, não consegue dizer nada. Não tem palavras, algo se passou no seu encontro com Amina que não pode expressar. Não sabe expressar; um não dito, a está marcando por dentro.

(a propósito de um documentário a que assisti)

sexta-feira, 4 de março de 2011

Escravatura (3)

Reduzido a força de trabalho, qual animal de carga, sem nenhum direito, comprado e vendido, como mercadoria, explorado até ao limite das suas forças, peça de uma engrenagem infame que reduz homens a escravos, sentia que não podia fraquejar. Não tinha escolha: só a revolta. Sairia disto, tinha a certeza, pois, ao contrário da  mãe não se sentia escravo por dentro, tinha forças para lutar. Não era escravo, fizeram-no escravo, sem direitos, sem documentos, sem reconhecimento... Pensava: “Um dia, mesmo que demore muito, haverá uma luz; segui-la-ei, com todos os companheiros da senzala, o portão não voltará a fechar-se e poderei, enfim, decidir da minha própria vida".

quarta-feira, 2 de março de 2011

A escravatura (2)

Ouvia, vezes sem conta: “não podes fazer, não podes sentir, não podes imaginar…”, mas que vida era esta que a própria mãe lhe impunha como destino, como se nada houvesse a fazer. Crescer com a ideia de que tudo é impossibilidade, perturba até os sonhos; sempre nos seus sonhos aparecia uma portão, um capitão do mato, um estrada sem saída, um labirinto que acabava num palmeiral, onde, por entre os ramos, o sol sempre se escondia.  Por que seria sempre pôr do sol? Por que se fechava o portão? Por que terminava a estrada? Pesadelos da noite que a dura realidade do amanhecer tornava reais, sempre a mesma senzala, sem nada, que não fosse a voz do feitor, um naco de pão, uma enxada, um trilho para caminhar até à roça e o mesmo trabalho forçado. Trabalhar, trabalhar, horas e horas, quantas mais melhor, dependeria da época do ano, mas sempre muitas, claro.

terça-feira, 1 de março de 2011

A escravatura (1)

Tinha sentimentos e sonhos de gente, mas não podia ser gente. Não o consideravam como tal. Tinha vontade, razão, ideias, desejos..., mas não tinha a liberdade de fazer fosse o que fosse. Vivia aprisionado e a  prisão não estava apenas em não poder sair pelo portão da fazenda, em não poder saltar os muros da roça, em não poder  atravessar o rio para o lado de lá. A liberdade não estava em lado nenhum. Sabia-o e por isso ficava ali, incapaz de decidir o que fosse sobre a sua própria vida.
Questionava se poderia viver naquela tempestade interior toda a sua vida? E a resposta era invariavelmente a mesma: impossível, resistir. Tinha de encontrar uma saída, antes que lhe aprisionassem também a alma. A liberdade era uma voz interior que não podia calar, embora, quando a raiva apertava mais, fizesse de tudo para silenciar esse desejo de ser livre. Fazia-o para sobreviver.