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sexta-feira, 26 de agosto de 2016

Os meninos de Aleppo

A criança síria, resgatada dos escombros de uma casa em Aleppo, após mais um bombardeamento (já nem sei de quem são as bombas, são tantos a disparar), sentada, quase irreconhecível, paralisada, no banco da ambulância que a levou ao hospital, parece estar a recuperar, enquanto o irmão não resistiu e já morreu.
A tua mudez é ensurdecedora, apela à responsabilidade do mundo. Oiço os teus gritos silenciosos e sinto-me responsável pelo que te está a acontecer, mesmo que pouco possa fazer, mesmo que tenha escrito muitas vezes contra os ditadores, os fundamentalismos, a guerra, a violência…; sinto que o que te aconteceu me diz respeito.
O pior ainda é que quase já ninguém se sente responsável; o pior é que as imagens de crianças denunciando e clamando pela consciência do mundo começam a ser tão banais que temo se tornem irrelevantes. Jantamos, conversamos, desligamos a televisão… e seguimos as nossas vidas como se os meninos de Aleppo e todos os outros meninos, vítimas de tantos abusos, fossem apenas imaginação.



segunda-feira, 22 de agosto de 2016

O uso do burquini

Sou contra. Poderia aduzir razões (muitas, até) mas de nada serviria, quando se trata de lidar com extremos. Não posso dizer que não seja sensível à justificação cultural, mas a mesma é válida para quem quer andar de monoquini ou sem nada, mesmo. Não poderia haver uma maneira de pensar um meio termo, saber o que uns e outros poderíamos reciprocamente aceitar, em sociedades em que temos de viver juntos? Não haverá maneira de encontrar pontos de cedência, sem que tudo desmorone, sem que qualquer espécie de diálogo se torne possível?

segunda-feira, 15 de agosto de 2016

Tagore, aforismos (2)

Disse o poder ao mundo:
                                                      -És meu!
                                                      E o mundo fê-lo prisioneiro no seu trono.
                                                   
                                                      O amor disse ao mundo:
                                                      - Sou teu!
                                                      E o mundo deixou-lhe livre toda a casa.


(Aí está, nada aprisiona mais do que o poder, mesmo que os poderosos vivam na ilusão do contrário. Só o amor liberta, porque nada exige).

domingo, 14 de agosto de 2016

Tagore: aforismos (1)

                                               
                                               Se de noite chorares pelo sol, 
                                                não verá as estrelas.


Chorar pelo que não podemos ter, só nos impede de desfrutar do que temos.

(Coração da Primavera, p. 103)

segunda-feira, 1 de agosto de 2016

Tagore, poeta indiano

Estou a reler uns textos de Tagore: ás vezes entendo tudo, ás vezes não entendo nada, ás vezes fico  a pensar, a questionar-me, porque me atrapalha esta racionalidade? Porque não me deixo levar por um misticismo que tudo toca?
Não sei, quero sempre razões, explicações, causas e efeitos, quero sempre compreender, mas sinto que alguma coisa se afasta de mim.

sábado, 25 de junho de 2016

Pessoas e sentimentos

Queria tanto escrever de forma simples, sobre  coisas importantes, mas não sou capaz. Vivo enredada  em conceitos, teorias..., que servem para muito pouco, porque nada é mais importante que a vida concreta de pessoas concretas, que riem, choram, amam, desprezam, sentem raiva, compaixão...; pessoas reais, afinal de contas.

quinta-feira, 23 de junho de 2016

Refugiados/deslocados: uma história (2)

- Não preciso de água, o sol magoa-me, preciso de chão, de terra, que a minha raiz seja colocada a uma profundidade boa, para poder crescer direitinha e forte. Sem chão não vou poder resistir ao burburinho do vento, mesmo que seja fraco, não resistirei à chuva, mesmo que seja pouco forte - queixava-se a flor. 
Há tantos perigos que espreitam quando as raízes são fracas e não temos os apoios que precisamos para nos sentirmos confortáveis na terra. Preciso de uma raiz presa à terra e de uma estaca que me ajude a segurar em pé.
 A menina replantou a planta, fez um buraco mais fundo, colocou a raiz completamente dentro da terra, alisou-a, fez uma pequena poça que encheu de água e colocou-lhe, junto ao caule, uma estaca, como uma muleta, para que a flor não caísse e se partisse, com o vento ou algum encontrão.
Ficou à espera que ela reagisse àquela operação, sim, que replantar uma planta é uma coisa difícil e que precisa de cuidados para ser bem sucedida. A flor precisava de força para se agarrar com sucesso à vida e à terra do canteiro. 
Passou tempo. A flor sobreviveu. Caíram-lhe as folhas, o fruto nesse ano não amadureceu, mas ela agarrou-se à terra do canteiro, do seu canteiro, agora sentia que aquela terra também era sua. As raízes estão fortes, sente-se bem, está como se aí tivesse nascido.

Na próxima Primavera, renascerá, terá folhas, flores e frutos. Presa à terra, está presa à vida; ter um chão é sentir que nada de mal lhe pode acontecer e se acontecer terá raízes para se defender. Já não acorda com dores de coluna, de cabeça e de abraços, já não precisa de muletas nem de cuidados especiais, é igual às outras flores, precisa dos mesmos cuidados.