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segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Somos seres humanos situados

Importa analisar a universalidade dos direitos humanos, não para a pôr em causa, mas para mostrar a sua insuficiência. Não chega dizer: pertencemos todos à Humanidade, temos uma razão e uma liberdade que ninguém pode pôr em causa; não chega dizer: “tu tens direitos, és um ser de direitos”, importa olhar o individuo na sua situação. Somos seres situados, na nossa vida concreta, há contextos que se tornam determinantes do viver; contextos, onde, o que define o humano é muito mais a experiência religiosa, a pertença a uma cultura, a um povo ou a um grupo, do que a noção universal de Humanidade. Não reconhecer isto, é cair em impasses ou em respostas parciais que não são solução para as questões dos refugiados, dos migrantes, da diversidade com que a Europa (na verdade, o mundo todo) está confrontada.



quinta-feira, 8 de outubro de 2015

De que ordem são as injustiças?

São de natureza social, diriam uns; são  de natureza cultural, diriam outros; não é possível distinguir entre estes dois pólos, diriam ainda outros. Ou seja , o debate não é linear. Na verdade, o que mostram as sociedades actuais, democráticas, abertas e diversas, é a necessidade de considerar que qualquer hierarquização cultural é ilegítima, não há culturas superiores umas as outras, o que há é diferenças culturais. Mas, depois, vem a realidade e mostra o absurdo: fundamentalismos religiosos que decapitam, crucificam, chicoteiam...como se estivessem  num qualquer delírio que os impede de pensar. Isto é o quê?
(O jovem da Arábia Saudita condenado à morte, por crucificação, por estes dias, é um triste exemplo. Intolerável. Vamos ver o que diz a comunidade internacional!) 


terça-feira, 6 de outubro de 2015

Reconhecimento

Não há justiça sem reconhecimento social, certamente, mas também não há justiça sem o  reconhecimento das diferenças culturais. A redistribuição material de bens responde às injustiças económicas, mas não responde às injustiças sentidas pelos grupos minoritários que se vêem culturalmente desvalorizados (talvez, o caso mais flagrante seja entre nós o dos ciganos, mas também  há grupos culturais de origem africana, por exemplo, desvalorizados na sua diversidade cultural).
Há padrões que hierarquizam as culturas, nem que seja de forma tácita, há preconceitos e estereótipos em relação a determinados grupos culturais, portanto, a luta por justiça requer tanto a redistribuição como o reconhecimento cultural.

sábado, 3 de outubro de 2015

Cultura, a diversidade cultural

cultura é uma construção humana, determinada pelos contextos geográficos, sociais e históricos em que as pessoas nascem e vivem, pelas condições que influenciam, desde sempre, a vida e a socialização de todos os grupos humanos. As pessoas das planícies, das montanhas, dos desertos ou das ilhas, não vivem as mesmas dificuldades, não lutam contra os mesmos elementos, não criam os mesmos medos, os mesmos interditos, os mesmos sentimentos de vitória ou de derrota e por isso não se relacionam do mesmo modo com o desconhecido, o meio ambiente, os vizinhos…
Assim, pode dizer-se que cada povo tem uma identidade cultural que vem de muito longe, encerrando traços específicos, alguns visíveis e que podem ser partilhados e outros invisíveis e dificilmente partilháveis.Na realidade, podemos aprender sobre a língua, a história, a música, a literatura, as tradições…, de outros povos, mas dificilmente aprenderemos sobre os seus valores e os seus sentimentos – pelo que têm de convicção profunda que só os próprios sentem e se revela na forma como pensam, amam, educam os filhos, tratam os mais velhos...

terça-feira, 29 de setembro de 2015

Anne Frank: o diário (3)

Há-de chegar o dia em que esta guerra medonha acabará, há-de chegar o dia em que também nós voltaremos a ser gente como os outros e não apenas judeus” – escreveu Anne no seu diário, em 11 de abril de 1944.
Para ela e para milhões de judeus esse dia não chegou. Ficou o seu diário, um importante testemunho. Quando Anne fez treze anos e vivia ainda uma vida normal e feliz com os pais e a irmã numa casa no centro de Amesterdão, recebeu de presente um diário, que leva consigo para o refúgio no depósito das empresas do pai. 
Escrever tornou-se uma tábua de salvação. “Quando escrevo, sinto um alívio, a minha dor desaparece, a coragem volta”- escreve a 5 de abril de 1944. 
Com o diário, de capa axadrezada, em que o vermelho é a cor dominante, a que chama de Kitty, a amiga, pode desabafar, conversar, dialogar, interrogar, pensar.... Este e os cadernos que se seguiram foram guardadas por Miep, uma das colaboradoras, e entregues ao pai, sobrevivente de Auschwitz, que o publicou pela primeira vez em 1947. 
No museu está o original, aberto, podemos ver a letra de Anne, certinha, pequena...impressiona um pouco, pois escreve já com o objectivo de publicar, sabe que no fim da guerra haverá interesse por escritos desta natureza. Ela tem planos, quer ser escritora, ironicamennte, o seu livro é um dos mais editados e lidos do mundo. 
(O diário de Anne Frank acaba de ser reeditado em Portugal, pela editora Livros do Brasil).

sexta-feira, 25 de setembro de 2015

Anne Frank: o anexo (2)

Em 6 de Julho de 1942, a família FranK, o pai Otto, a mãe Edith, as filhas Anne e Margot, “mergulha” na clandestinidade, uma semana mais tarde junta-se a família Van Pels, pai, mãe e filho, e pouco depois o senhor Fritz, amigo da família Frank. São todos alemães, fugiram para a Holanda, mas não estão a salvo. A perseguição aos judeus não tem limites, chegou aqui também. 
Estas oito pessoas passam a viver naquilo a que Anne, no seu diário, chama o “anexo”, ajudadas por quatro colaboradores. Não é uma casa pequena separada da casa principal, como estaríamos à espera. O anexo é a parte de cima da casa onde o pai  tinha as suas empresas, com a fachada da frente virada para um dos canais de Amesterdão. O anexo é a parte de trás, ocupando dois andares e o sótão virados para as traseiras da casa, espaço que serviu, até então, para depósito/armazém das especiarias e outros produtos transformados nas empresas, com janelas pintadas de preto, para que a luz não os deteriorasse. O depósito/o anexo estava separado do resto da casa por uma porta disfarçada de estante (está como na época) para não levantar suspeitas.
Permanecem neste refúgio, muito exíguo, mas onde conseguem ter um quotidiano "quase normal", lêem, escutam a rádio, alegram-se com o avanço dos Aliados nas costas da Normandia, exasperam com as notícias sobre as câmaras de gás e os campos de concentração... Sobrevivem, sobrevivem..., esperam o fim da guerra. Mas, a 4 de Agosto de 1944, dois anos e um mês depois, são presos e levados para diferentes campos de concentração. Anne e a irmã morrem em Bergen-Belsen, na Alemanha, de tifo, a mãe morre em Auschwitz; o pai, que também foi levado para aí, foi o único dos oito refugiados que sobreviveu. Depois da guerra, em 3 de Junho de 1945, regressa a Amesterdão, sabe, então, da morte da mulher e das filhas. Miep, uma das colaboradoras, entrega-lhe o diário de Anne. 

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Anne FranK (1)

Estive há pouco tempo na casa museu Anne Frank, em Amesterdão. Havia muitos visitantes, jovens de escola, adolescentes. Pensei na importância de lugares como este,  pelo que significa, pelo que simboliza, pelo grito ensurdecedor que não deixamos de ouvir, durante toda a visita. Voltamos a mais de setenta anos atrás, recriamos, na mente, o cenário, a vida, os sonhos e os medos, daquelas pessoas que ali viveram durante dois anos.  Fechadas, literalmente, como se não existissem, até que um dia são traídas, denunciadas e presas pelos alemães.Voltamos atrás, mas não podemos, infelizmente, achar que tudo é história, que tudo é passado. Não é. Nesse dia, semana e mês, outros perseguidos por guerras, religiões..., atravessam países, procuram refúgio, apelam por solidariedade.