Estava sentada, bem lá no fundo do pátio, sozinha, como se quisesse entrar no interior de si mesma e perscrutar, até ao limite, o inferno que a consumia, em vez de o afastar, distraindo-se, concentrando-se noutra coisa,. Inferno que a consumia, sim, que ninguém pode viver, por muito tempo, com tamanha mágoa, sem cair num poço sem fundo, num abismo existencial.
Como a mãe lhe fazia falta! Nunca podia ter imaginado o quanto! Se não fosse a avó, não aguentaria. Ter treze anos e ficar sem mãe, quando já não se tem ou não se sabe quem é o pai, é ficar órfã muitas vezes, numa deriva que não sabia até onde poderia ir. A mãe era a luz, o colo, o porto seguro..., agora, tudo ruíra, o seu mundo ruíra, como não julgava possível acontecer.
Era-lhe insuportável estar com as outras pessoas, falar, conversar..., quase se esquecera que lá fora o mundo continuava, tudo continuava, tinha de fazer o luto, sabia-o, pois não poderia viver por muito mais tempo encerrada numa dor e numa solidão que não a conduziriam a lado nenhum.
- Quem é o meu pai?- pensava e perguntava, continuamente.
- O teu pai morreu - ouviu muitas vezes a mãe dizer-lhe.
- Mas quem é? Podes dizer-me quem é, devo ter outros irmãos, outra família, só metade de mim parece existir, uma nuvem de silêncio se espalha sobre tudo o que tenha a ver com o meu pai, e isso sempre me entristeceu.
- O teu pai já morreu - dizem-lhe também a avó e os tios.
- Mas se morreu, porque não dizem quem foi! Não é por isso que deixa de ser meu pai!
Nunca precisara dele como agora, mas como poderia encontrá-lo sem ajuda?
- Talvez, a minha mãe dissesse a verdade e ele esteja morto ou talvez ande por aí e o destino um dia nos una, aliás, já vive em mim, fantasiado ou real, não sei. E bonito o meu pai, elegante, boa pessoa.... Talvez, seja de Maputo ou de outra cidade e a a minha mãe se tenha perdido dele mesmo antes de eu nascer, talvez seja de uma vila à beira da estrada. Talvez seja ...