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quarta-feira, 15 de julho de 2015

Génesis, a exposição

Visitei a exposição de Sebastião Salgado, e gostei muito. Não posso dizer que tenha sido surpreendida, de algum modo, conhecendo outros trabalhos do autor, esperava o que vi. Há uma qualidade e uma essência nas fotografias que chega e ultrapassa a mera observação. Salgado mostra, denuncia, propõe, compromete...
Para mim são particularmente tocantes os rostos. O que dizem os rostos de Sebastião Salgado? Ninguém sabe. Dizem tudo.

terça-feira, 14 de julho de 2015

Voltando aos ditadores (4)

Mas vem um dia e a justiça aparece, no caminho do ditador. É acusado e detido em Londres,  ficando em prisão domiciliária numa mansão nos arredores da cidade. 
Abrem-se noticiários, formam-se movimentos a favor e contra, o próprio governo chileno empenha-se para que ele não seja extraditado para Espanha e seja julgado no Chile. A senhora Thatcher visita-o, intercede por ele. Todos se movimentam; a novela dura mais dum ano, até que, finalmente, depois de revogações e nova sentença, surge o veredicto: Pinochet vai de volta ao Chile.
O argumento da sua debilidade física e mental, do seu precário estado de saúde, parece sortir efeito. Contudo, não convenceu e foi desmentido, logo que o senhor pisa solo chileno. Levanta-se leve e fresco para abraçar os companheiros de sempre. Os que acreditaram na sua doença, devem estar roídos de fúria; foram bem enganados. 
(a  justiça seguiu os seus trâmites) 

domingo, 12 de julho de 2015

Voltando aos ditadores (3)

O mesmo telejornal  que mostrava estudantes a serem massacrados e mortos nas ruas de Santiago, mostrava também o ditador a assistir à missa. Não parece aceitável, para nenhum católico,  ver a igreja bajular e dar a comunhão a criminosos. 
Não sei se eles sabem, mas eu sei que Deus está zangado com todos “Pinochets” deste mundo, só pode estar, mesmo que alguns tenham financiado a construção de igrejas, templos e catedrais - sim, que estes senhores usam descaradamente a religião, porque sabem que a instituição nunca diz não aos poderosos - o que se passou e ainda se passa na América Latina é intolerável. Uns quantos, poucos, com tudo e todos os outros, muitos, sem nada. 
(agora, parecem soprar novos ventos)

sábado, 4 de julho de 2015

Voltando aos ditadores (2).

Como se podem perdoar os ditadores que, ao longo da história da humanidade, foram autores e mandantes das chacinas mais brutais e horrendas? Não se pode, evidentemente. Mesmo, analisando todas   as circunstâncias, contextos e situações, não se encontram  razões para justificar os seus atos.
Talvez o caso limite seja Hitler e o nazismo, mas há (e houve) outros:  Fidel Castro, Mugabe, Hussein, Kadafi, Miloseviche e muitos, muitos, outros, em todos os continentes. 
Todos têm uma ânsia infindável de poder; fazem o que for preciso para o manter. Formam exércitos, constroem castelos, palácios, bunkers...; compram iates, aviões..., colocam rios de dinheiro em paraísos fiscais e, enquanto isso, o povo, o seu povo, vai definhando na pobreza, na ignorância na falta de todos os direitos.

sexta-feira, 3 de julho de 2015

Voltando aos ditadores (1)

“Como me podem querer mal, como me podem odiar, como me podem querer julgar, eu um homem bom que fiz tudo pelo meu país! Amei o Chile, amei-vos a todos, sempre trabalhei por vós e para vós, meu Deus que injustiça” - gritava o ditador, julgando o mundo todo contra ele.
Nem todo o mundo estava contra ele, mas devia estar, acontece que há países, como há homens, que batem palmas aos sacanas. Qualquer ditador é um sacana, venha de onde vier, da direita, da esquerda, de qualquer que seja a ideologia. Todos, perdida a razão e o respeito pelos outros, impõem o medo e o terror da lei, da sua lei. 
Julgam-se iluminados, mas não há nenhum desígnio divino, apenas vontade humana. Alguém os suporta e mantém no poder. Estão ao serviço de interesses, de fações e de bens particulares. Não venham falar de bem comum, de justiça, de amor ao povo... Não podem.

quinta-feira, 2 de julho de 2015

O velho e a jovem (4)

- Ninguém me entende, sabem apenas criticar-me. 
- Eu, já não sirvo para nada, a minha vontade já não conta. Sinto-me humilhado e nada é pior do que isso.
Enquanto ela rejeita a família, no caso dele foi a família que o rejeitou. Não é  mesma coisa. O abandono dos velhos e a rebeldia dos adolescentes juntam duas criaturas na noite, de uma qualquer cidade, mas não chega a ser um encontro, cada um seguirá o seu caminho.  

quarta-feira, 1 de julho de 2015

O velho e a jovem (3)

Também ela se comoveu, pela primeira vez, fala com ternura na voz, com um misto de surpresa e dó. Afinal, ele parecia sofrer tanto ou mais do que ela.
- Eu sou a Cláudia, queres vir passear comigo? Anda, levo-te para uma casa já fora da cidade onde vive uma amiga minha e onde às vezes costumo ficar. Anda, vem, vem ... 
Arrastado por ela, o velho deixa-se conduzir para fora da estação, sem perguntas mas observando e pensando sempre.
Pela primeira vez, o velho fala:
- Chamo-me João - fez de novo silêncio - Tu saíste, eu fui posto fora de casa.
- Mas eu não quero viver na rua - grita ela.
- Eu também não quero viver num lar - diz  ele.
Cláudia, ora corria, ora parava, ora dizia coisas sem sentido, ora ria e chorava ao mesmo tempo. A confusão de alguém que sente raiva e culpa por uma liberdade que quer, e julga ter conseguido, mas que não lhe serve para nada, antes, a maltrata e prejudica.
Cláudia parece não ser capaz de cuidar de si, hoje, como em muitas outras noites, terminará no beco de sempre, prostituindo-se e consumindo haxixe. O velho pressente a situação mas não é capaz de dizer nada. Não é capaz. Que coisa é essa que o impede de dizer seja o que for, ao mesmo tempo que se questiona: "para que quer Cláudia a liberdade se não é capaz ou não pode ser livre"? 
- Eu sei que se pegar no telefone e disser onde estou, voltarei, ainda hoje, para casa -  diz a jovem.
Sabe isso, mas sabe também que de novo voltará a fugir sem saber de quê ou de quem. Ele, ao contrário, sabe que não vai pegar no telefone, nem voltar para casa. Ninguém o espera.
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