Hoje, à nossa memória, retornam imagens de medo, terror, desconcerto, impossibilidade...
A violência é tão velha como o homem, mesmo a violência organizada. "Esta bala é antiga", diz Jorge Luís Borges, no texto In memoriam de J. F. K., do livro "O Fazedor". É isso, mesmo que mude o material com que ela é construída. É a mesma maldade, a mesma vingança, a mesma prepotência, o mesmo egoísmo. Temos aprendido tão pouco!
(Releio continuamente Borges, ou melhor, leio-o infinitamente. Pudera eu compreender tudo o que dito, e não dito, numa página de Borges)!
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sábado, 11 de setembro de 2010
sexta-feira, 10 de setembro de 2010
Fanatismo é fanatismo, venha de onde vier
O pastor evangélico que ameaçava queimar duzentos livros do Islão retrocedeu, depois de ter feito tremer as mais altas instâncias e de ter feito um alarido global. Ficámos a saber a vulnerabilidade em que estamos, pessoas e Estados.
Independentemente de que lado venha, o fanatismo é sempre uma radicalidade que não deixa espaço a outros campos, a outras margens, a outros olhares. Redutor, portanto. Nenhuma realidade é a preto e branco, a complexidade apoderou-se do mais mínimo dos nossos actos. É assim. Viver nas sociedades de hoje é ter de conviver com múltiplas e múltiplas oposições. O caso da religião só ganha a dimensão que ganha pelo que tem de decisivo, de constitutivo, de horizonte, na vida de muitos. Abrange tudo, acrescentando ainda elementos da ordem da paixão que não deixam ver claro.
Independentemente de que lado venha, o fanatismo é sempre uma radicalidade que não deixa espaço a outros campos, a outras margens, a outros olhares. Redutor, portanto. Nenhuma realidade é a preto e branco, a complexidade apoderou-se do mais mínimo dos nossos actos. É assim. Viver nas sociedades de hoje é ter de conviver com múltiplas e múltiplas oposições. O caso da religião só ganha a dimensão que ganha pelo que tem de decisivo, de constitutivo, de horizonte, na vida de muitos. Abrange tudo, acrescentando ainda elementos da ordem da paixão que não deixam ver claro.
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quarta-feira, 8 de setembro de 2010
Debaixo do chão
Os mineiros soterrados no Chile cumprem uma rotina de sobrevivência. O mínimo, para manter a sanidade possível. Quando há medo, desesperação, presente e futuro incertos, toda a liberdade e toda a resistência humanas parecem sucumbir ou diluir-se. Podem vir à tona, sentimentos menos dignos e inevitáveis conflitos. Ter consciência de que é assim, pode ajudar a evitar esses momentos, indesejáveis, obviamente, mas possíveis.
terça-feira, 7 de setembro de 2010
Os ciganos (2)
Era uma vez uma jovem de olhos negros, com uma longa cabeleira preta, que passeava pelo bosque, junto à aldeia onde vivia, quando encontrou o príncipe daquele reino. Olharam-se, e ele ficou enamorado da sua beleza e da forma como corria descalça e livre pelas margens do rio. Desde então, passou a ir muitas vezes à aldeia da jovem, com a intenção de a namorar.
As famílias não achavam bem o casamento, por serem pessoas muito diferentes. Naquela aldeia, não era costume casar com pessoas de fora, davam muita importância à família: se alguém fazia um bom negócio, era como se todos fizessem; se alguém tinha uma grande alegria, todos tinham; se alguém ficava doente, todos corriam a dar-lhe carinho; se alguém cometia um delito, toda a família se sentia envergonhada. Nunca abandonavam as crianças nem os velhos. Em todas as famílias, o homem mais velho – a quem chamavam o patriarca – era muito respeitado, representava a família no Conselho da Aldeia, dava conselhos e procurava que todas as tradições se cumprissem.
O Conselho do Reino e também o Conselho da Aldeia reuniram-se para discutir o namoro de um príncipe com uma aldeã. Depois de ultrapassados os problemas, começou a preparar-se o casamento. Uns dias antes, como era costume do seu povo, a jovem fugiu com o noivo para o palácio. Foi bem recebida, apreciavam a sua música, as suas danças e as suas capacidades para adivinhar o futuro. Mas, mesmo assim, começou a sentir-se infeliz, não se sentia livre. Não questionava a autoridade do marido, mas custava-lhe cumprir todas as regras do palácio, as horas de comida, as horas de saída, os sapatos sempre a apertar-lhe os pés, tudo previamente fixado…
Decidiu, então, que não iria mais casar-se. Pediu perdão à família e ao povo por não ter pensado bem nas consequências do seu casamento com o príncipe. O seu povo aceitou, mas não podia mais ficar naquele reino, a renúncia ao casamento era uma ofensa que não podiam suportar, esse povo nunca quebrava os seus compromissos. Arrumaram as suas coisas e, à hora em que se devia celebrar a boda, iniciaram uma longa viagem, sem fim e sem destino, que ainda hoje dura. Dizem que, lá pelo século XII, um monge os encontrou nos Montes Athos, no norte da Grécia, talvez vindos da Ásia Menor, mas a partir do século XV há relatos da sua presença em vários países da Europa. Também chegaram a Portugal, dizem que são entre 40 a 50 mil.
As famílias não achavam bem o casamento, por serem pessoas muito diferentes. Naquela aldeia, não era costume casar com pessoas de fora, davam muita importância à família: se alguém fazia um bom negócio, era como se todos fizessem; se alguém tinha uma grande alegria, todos tinham; se alguém ficava doente, todos corriam a dar-lhe carinho; se alguém cometia um delito, toda a família se sentia envergonhada. Nunca abandonavam as crianças nem os velhos. Em todas as famílias, o homem mais velho – a quem chamavam o patriarca – era muito respeitado, representava a família no Conselho da Aldeia, dava conselhos e procurava que todas as tradições se cumprissem.
O Conselho do Reino e também o Conselho da Aldeia reuniram-se para discutir o namoro de um príncipe com uma aldeã. Depois de ultrapassados os problemas, começou a preparar-se o casamento. Uns dias antes, como era costume do seu povo, a jovem fugiu com o noivo para o palácio. Foi bem recebida, apreciavam a sua música, as suas danças e as suas capacidades para adivinhar o futuro. Mas, mesmo assim, começou a sentir-se infeliz, não se sentia livre. Não questionava a autoridade do marido, mas custava-lhe cumprir todas as regras do palácio, as horas de comida, as horas de saída, os sapatos sempre a apertar-lhe os pés, tudo previamente fixado…
Decidiu, então, que não iria mais casar-se. Pediu perdão à família e ao povo por não ter pensado bem nas consequências do seu casamento com o príncipe. O seu povo aceitou, mas não podia mais ficar naquele reino, a renúncia ao casamento era uma ofensa que não podiam suportar, esse povo nunca quebrava os seus compromissos. Arrumaram as suas coisas e, à hora em que se devia celebrar a boda, iniciaram uma longa viagem, sem fim e sem destino, que ainda hoje dura. Dizem que, lá pelo século XII, um monge os encontrou nos Montes Athos, no norte da Grécia, talvez vindos da Ásia Menor, mas a partir do século XV há relatos da sua presença em vários países da Europa. Também chegaram a Portugal, dizem que são entre 40 a 50 mil.
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segunda-feira, 6 de setembro de 2010
Mineiros chilenos, lá no fundo da terra
Tenho pensado tanto nestes homens, no que lhes está a acontecer, a eles, às suas famílias, aos chilenos, a todos nós, no fundo, mas sem possibilidade de escrever seja o que for. É tal a precaridade, a contingência, a possibilidade de estarem bem e de desmoronarem no minuto seguinte, que todos estamos em suspenso. Viver uma situação desta natureza, é tocar vários limites. Vem-me à memória Jaspers, existencialista, que teorizou sobre as situações limite. Um dia destes, relerei os seus textos, na tentativa de perceber alguma coisa mais...
sábado, 4 de setembro de 2010
Tristes acontecimentos
Ontem, final do julgamento Casa Pia, assistiu-se ao melhor e ao pior do humano, ao rosto e à máscara, à verdade e à mentira, ao riso e ao choro, à complacência e à raiva... E hoje o dia acordou de novo, leve para uns, pesado para outros e seguramente difícil para todos.
E como seguirá a vida (e a consciência) daqueles que só não estiveram ali sentados por prescrição dos crimes ou outras manobras? Tento tantas vezes entender o direito, mas não atinjo. O desfasamento entre o legal e o moral, assusta-me.
E como seguirá a vida (e a consciência) daqueles que só não estiveram ali sentados por prescrição dos crimes ou outras manobras? Tento tantas vezes entender o direito, mas não atinjo. O desfasamento entre o legal e o moral, assusta-me.
sexta-feira, 3 de setembro de 2010
Sou israelita e palestiniana, estou sentada à mesa
Desde que visitei Israel, há mais de vinte anos, vi (e senti) o que é o viver quotidiano de ambas as comunidades. Impressionante e perigoso. Assisti a cenas que jamais esquecerei: a ostensiva presença militar, as contínuas identificações, os tiros numa das entradas da cidade velha, julgo que na porta de Damasco, a impossibilidade de cumprir todo o roteiro da viagem previsto (lembro-me que não fomos à gruta dos pastores, mesmo em Belém, uma notória tensão impediu uma visita normal).
Eu vivi isto, com maior intensidade, apenas num dos dias da viagem, mas há gerações sucessivas de israelitas e palestinianos que o vivem, há décadas, todos os dias da sua existência, com muitos direitos violados, muitas humilhações, etc., etc. Assim é impossível continuar, todos o sabem.
Percebe-se, por isso, a importância do retomar das negociações para a paz. A imagem de ontem, o 1º ministro israelita, o presidente da autoridade palestiniana e a secretária norte-americana, mostra que a paz é possível. Não sei por que tenho tanta esperança, se a história mostra o contrário? Mas tenho.
Eu vivi isto, com maior intensidade, apenas num dos dias da viagem, mas há gerações sucessivas de israelitas e palestinianos que o vivem, há décadas, todos os dias da sua existência, com muitos direitos violados, muitas humilhações, etc., etc. Assim é impossível continuar, todos o sabem.
Percebe-se, por isso, a importância do retomar das negociações para a paz. A imagem de ontem, o 1º ministro israelita, o presidente da autoridade palestiniana e a secretária norte-americana, mostra que a paz é possível. Não sei por que tenho tanta esperança, se a história mostra o contrário? Mas tenho.
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