Haverá alguém que não queira uma escola sem “chumbos”? Julgo que não. Era bom que se estendesse até ao final da universidade, dirão muitos. Puro delírio, mas coisa óptima, se o sucesso por decreto resolvesse o problema. Não resolve, como sabemos, serve apenas fins políticos, ainda que os argumentos da ministra, como lhe compete, sejam sempre pedagógicos, insistindo que apenas pretende abrir um debate público sobre o assunto. Não vem mal ao mundo debater seja o que for. Mas, de algum modo, propor isto é já admitir a falência de uma escola equitativa, integradora, com base no princípio da igualdade de oportunidades. É admitir que não se tem capacidade de resolver as questões do insucesso e do abandono escolar actuando nas causas, como deve ser feito.
Um sistema sem retenções, uma vez legislado, é um sistema em que ninguém fica retido, saiba muito, pouco ou nada. Mas o engraçado é que nos querem fazer crer que, adoptada esta medida, todos vão saber muito, por passo de mágica, talvez. E, então, por que é que não sabem muito, agora, o que é que impede os alunos de saber mais, é o haver retenções?
É claro que a discussão não é esta, como a ministra muito bem sabe. As suas afirmações são interessantíssimas, para não dizer outra coisa: “No ministério, todas as medidas que tomamos é para melhorar a educação”? Então, pois, para que haveria de ser, não é com certeza para melhorar a meteorologia; “Nalguns casos, a retenção não serve para nada”, supõe-se, então, que noutros casos servirá, ou não? Para ser coerente, deveria dizer que a retenção não serve em nenhum caso; “O que queremos é que os alunos aprendam mais, não é o facilitismo, ao contrário, é a qualidade e a exigência”. Ora, aqui está um ponto de acordo.
Uma vez identificado o campo, por que não se questiona o essencial? Por não se questionam as medidas, as acções e os compromissos que têm de ser pensados e postos em prática, para acabar com o abandono e o insucesso escolares? Por que não se questionam os problemas e as dificuldades dos apoios educativos? Por que não se questionam os problemas e as dificuldades dos percursos alternativos, do ensino especial, etc.? Por que não se questiona o valor de tantos relatórios e tantas burocracias? Por que não se questiona a cooperação e a complementaridade das diferentes intervenções, tantas vezes, justapostas ou de costas voltadas? …
Estamos perante um sistema que apresenta fragilidades várias, a questão da qualidade é real, não se pode negar que, há muito, se ensina para a média e a média baixa – uma quase inevitabilidade, dado o número de alunos por turma e a sua heterogeneidade. Mesmo, compreendendo a justiça da diversificação de ofertas curriculares e de novas oportunidades de formação, não parece aceitável que haja jovens com o 9º ano incapazes de compreender o que lêem ou de escrever duas frases articuladas; ou jovens com o 12º ano do ensino profissional que, confrontados com a falta de saídas profissionais, concorram à universidade, entrem, mas levem anos a fio a marcar passo, porque as suas bases estão a anos luz do que deveriam ser, com o consequente insucesso e o quase certo abandono. Isto tem custos pessoais, familiares e sociais importantes.
Claro que se pode sempre argumentar que a ministra fala do ensino não superior, mas pode-se separar uma coisa da outra? Ou que a educação, mesmo nestes casos, é sempre um ganho, mas, então, não é a educação um meio para a realização pessoal e a integração social dos jovens? É com certeza, e defraudar estas expectativas não pode ser visto como uma coisa legítima ou de somenos importância, porque não o é.
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