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terça-feira, 23 de maio de 2017

Viagem à Índia (3)

As pessoas, quase, não nos olham; falo daquelas que andam pelas ruas, permanecem junto às estradas, em pequenos negócios ou noutras ocupações, fazem colares de flores, junto aos templos, pedem esmola aos turistas…, parecem ausentes.

A mulher do semáforo. Era quase noite, já se via muito mal, num cruzamento de Nova Deli, uma senhora, com um filho ao colo, magra, muito magra, quase esquelética, aproxima-se dos vidros e pede esmola. Uma pessoa dá-lhe algum dinheiro (bastante até); ela agarra-o, amarrota-o dentro da mão e em momento algum olha a senhora que tenta comunicar com ela. Quase desvia o olhar, como se muros invisíveis a separassem  dos outros.
Ficará ali, à espera de outros turistas e de outros autocarros, para mais uma vez se dirigir aos vidros, de olhar perdido, pedindo esmola; ou deixará aquele cruzamento e aquele semáforo, quando perceber que a quantia é suficiente para comprar comida e alimentar os filhos.

O rapaz aprendiz de motorista.  Dizem que tem dezoito anos, mas aparenta menos. Fala pouco ou nada, mas está sempre atento e disponível para tudo. Está ali, porque tem de fazer um estágio de três anos, andar à beira de uma motorista já profissional, para poder vir a ser, no futuro, um motorista daquela empresa.
Quando nos deixam no aeroporto e nos despedimos, do guia, do motorista e deste jovem aprendiz de motorista, com um aperto de mão, faço-lhe uma festa na cabeça e digo-lhe algo, em inglês, para lhe mostrar como tinha sido importante o trabalho dele durante todo o circuito e desejar-lhe boa sorte na vida. Fica muito surpreso, não estava à espera, mas, sorriu e não baixou a cabeça: olhou para mim. Depois, fiquei a pensar: talvez, culturalmente, não tivesse sido muito propositado aquele gesto, mas quero lá saber de cultura, quero saber de gestos humanos.

O menino órfão. Cinco ou seis crianças rodeiam o grupo de turistas que visitam as ruínas duma cidade abandonada, há séculos, por falta de água, para venderem bugigangas ou pedir esmola. Quando subimos, pergunto a um deles: - por que pedes esmola, não vais à escola?
- Não tenho pai, não tenho mãe, vivo com uma avó.
Quando desço, o mesmo menino, continua: - não tenho irmãos, tinha uma irmã, mas morreu há pouco.
Comecei a achar que era demais, não precisava de tantos dramas, para conseguir uma nota dos turistas.
Pergunto ao mais crescido do grupo: - isto é verdade?
- É verdade, dos meninos daqui, é o que mais precisa.
Acredito. Dou-lhe uma nota. Afasta-se todo contente e eu fico a pensar: pode ser estratégia para convencer turistas, mas temo que esteja a falar verdade. 


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